Diz o conhecido ditado popular que “água de morro abaixo, fogo de morro acima e eleitor querendo trair, ninguém segura”.
O encerramento da campanha de primeiro turno de Fernando Haddad dar-se-ia no ABC paulista, mais precisamente em São Bernardo do Campo, berço do Partido dos Trabalhadores e local da residência de Lula da Silva. Este é um simbolismo muito caro ao lulopetismo.
Todavia, o vertiginoso crescimento do capitão da reserva do Exército Jair Bolsonaro nas pesquisas de opinião, mormente no Nordeste, reduto de Lula até aqui inquestionável, fez com que a direção da campanha do candidato petista o deslocasse para o município baiano de Feira de Santana, salvo alguma mudança de última hora.
Lá, mais à vontade, ao lado de Jaques Wagner e do governador Rui Costa, Haddad vai repetir o discurso lulista de defensor dos pobres e oprimidos.
A estratégia parece errada, como outras que o PT adotou nesta campanha. Na Bahia, Jaques Wagner e Rui Costa, salvo improvável tsunami nas urnas, estão com a eleição garantida para o Senado e governo da Bahia, respectivamente, ao passo que há outros lugares mais desfavoráveis a Haddad, que precisam da presença dele.
Todavia, o PT quer encerrar a campanha com apoteose e a Bahia é o lugar ideal, porque a maioria do eleitorado vota no PT, segundo os institutos de pesquisas, diferentemente do ABC paulista. Na Bahia, todo mundo o agrada, eleva-o à glória, exalta-o.
Quanto ao sensato Jaques Wagner é homem de partido. Desde a indefinição do nome de Lula, em razão de entraves jurídico-processuais, ele entendia que, no caso de impedimento do ex-presidente, o PT não deveria lançar candidato próprio, mas apoiar um nome viável de outro partido.
Wagner tinha simpatia por Ciro Gomes que, segundo ele, ainda tem chances de corresponder às “expectativas dos eleitores”.
O PT não aceitou a sugestão do ex-governador baiano. E Jaques Wagner passou a falar a mesma língua do partido e até embarcou na patacoada do ineficaz movimento “Lula livre”, embora soubesse que Lula estava juridicamente impedido de disputar a eleição presidencial. Mas é homem de equipe, estava fazendo o seu papel.
Jaques Wagner era o nome ideal para substituir Lula na chapa presidencial de 2018. Esperto, declinou da condição e preferiu a eleição para o Senado da República, que lhe garante oito anos de mandato, além de foro privilegiado.
Sobrou para Fernando Haddad, a outra opção de Lula.
Haddad segurou o rojão, embora uma parte dos petistas graúdos não o quisesse. Houve muita conversa, Lula bateu o martelo e mandou que todos obedecessem.
No PT ainda é muito clara a máxima “manda quem pode e obedece quem tem juízo”. E quem manda no partido é Lula e os demais obedecem, baixam a cabeça, subservientemente.
Contudo, Haddad não é homem de palanque. É uma cria da universidade. Intelectual, professor, mestre em economia e doutor em filosofia. Tem dificuldade de conviver com as cobras e lagartos petistas. Haddad tem pinta de sério e de defensor de suas convicções, o que é muito difícil estando no PT.
Em recente visita a Juazeiro da Bahia, Haddad ficou visivelmente desconfortável, quando um militante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra colocou um boné vermelho na cabeça do candidato presidencial. Haddad o tirou de imediato. Percebeu a gafe e o recolocou, mas, em seguida, livrou-se do incômodo boné. Um pouco de timidez, quiçá falta de costume com a demagogia das campanhas eleitorais.
Quando o PT o abandonou em 2016, depois de derrotado na disputa pela reeleição de prefeito de São Paulo, Haddad esteve em vias de deixar o partido, mas o esperto e estratégico Lula o impediu. Lula sabia o que estava fazendo.
Agora, às vésperas do primeiro turno, Haddad encarna o sonho de vitória dos petistas e aliados e ostenta a dificuldade de carregar o pesado fardo com os erros do partido. Até o momento, não tem conseguido justificar o conteúdo da maracutaia que o PT lhe passou às mãos.
Difícil mesmo de Haddad carregar é a tendência do eleitor no sentido de aderir à candidatura de Bolsonaro nesta reta final da campanha.
Não deixa de ser uma preocupação para o polido Fernando Haddad. Se ele for eleito, sairá das urnas com cacife suficiente para mudar o rumo das práticas estrambóticas do PT e firmar-se como líder à semelhança de Jaques Wagner.
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