“O preso é, essencialmente, um necessitado” (Francesco Carnelutti, jurista italiano, 1879-1965)
Não se discute aqui os fundamentos da condenação de Lula da Silva, tampouco os crimes que ele eventualmente tenha praticado. Esse é assunto para sua defesa, que tem se ocupado muito bem disto, exaustivamente.
Discute-se o momento de sua prisão, a extemporaneidade, a pressa na aplicação do cumprimento da pena, a antecipação do castigo judicial.
Qualquer primeiranista de direito conhece o artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal: “ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”. É a presunção legal da inocência.
Entende-se por trânsito em julgado a circunstância em que não há mais possibilidade de recurso em qualquer instância.
No caso de Lula da Silva, não é demais repetir, que ele foi condenado em primeira instância pela Justiça Federal do Paraná e, em segunda instância, pelo respectivo Tribunal Regional Federal.
Nesse momento, sobreveio-lhe a prisão, em razão de entendimento do Supremo Tribunal Federal que havia firmado jurisprudência quanto à execução provisória da pena. Entendimento estapafúrdio e desconforme a Constituição da República.
Por conseguinte, entendimento inconstitucional, porque os recursos ainda não se esgotaram. Há recursos de Lula pendentes de julgamento no Superior Tribunal de Justiça e, por extensão, na ocasião própria, no Supremo Tribunal Federal.
Logo, a prisão de Lula da Silva é ilegal e a execução provisória da pena não se ampara em nenhum lastro plausível. A vontade do juiz e dos tribunais não pode contrariar o preceito legal.
Ora, o mesmo artigo 5º, da Constituição da República, preceitua que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza…”
Por aí se vê, que Lula da Silva não está sendo considerado em igualdade de condições relativamente a outros condenados, por uma razão bastante simples: há caso em que houve condenação em segunda instância e o apenado está solto com o beneplácito do Poder Judiciário.
É o caso do ex-ministro petista José Dirceu. Condenado em segunda instância, Dirceu está em liberdade por ordem do Supremo Tribunal Federal. Aqui também não se discute os caminhos legais que o levaram à soltura, mas a semelhança entre os dois casos.
Então, existe um complô institucional para manter Lula da Silva preso. A lei aplicada a Lula da Silva é aplicada de modo diverso em relação a outros condenados.
Todavia, há uma hipótese razoável no sentido de que Lula da Silva venha a ser beneficiado em breve pelo instituto da prisão domiciliar ou em razão de habeas corpus que lhe colocará em liberdade.
Há outros inquéritos contra Lula, outras denúncias, outras investigações, virão outras sentenças possivelmente condenatórias.
Entrementes, a prisão deverá ocorrer lá na frente, depois de esgotados todos os recursos a que tiver direito o ex-presidente.
Antecipar o cumprimento da pena contraria a Constituição Federal e a lei processual penal.
Seguramente há um complô de interpretação que mantém Lula da Silva preso. Esse complô é formado basicamente pelo descompasso entre a Constituição Federal e decisões judiciais atabalhoadas.
O que assusta a democracia e operadores do direito é ver o Supremo Tribunal Federal, que é guardião da Constituição, quedar-se diante de tais absurdos processuais.
Se a dúvida está na dubiedade da lei, mude-se a lei ou exija-se que seja mudada, mas mantenha-se o amplo direito de defesa do acusado que “é, essencialmente, um necessitado”. Seja Lula da Silva ou qualquer outro.
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