Chorrochó, Bar Potiguar, pedaços de lembranças

“Mas a saudade é isto mesmo: é o passar e repassar das memórias antigas” (Machado de Assis, Dom Casmurro)

Há alguns anos veio-me a notícia de Chorrochó dando conta do falecimento de José Osório de Menezes. Notícia triste, cruel, surpreendente, como é toda notícia que trata das vicissitudes da morte.

Filho de família tradicional de lá, Osório era admiravelmente humilde. Não adquiriu a fama que tinham ou têm os demais irmãos, todos letrados e de elevada tarimba profissional e social.

Família de políticos, promotores de Justiça, advogados, professores, diretores de escola, nutricionista e servidores públicos respeitáveis.

Mas Osório tinha outro mister, também digno, muito digno, essencialmente digno: ocupava-se da pecuária da família. Dedicou-se a isto por muito tempo, todo o tempo.

Dizem alguns entendidos em vida alheia que sou saudosista, piegas e me preocupo demais com coisas reles, desprezíveis, sem importância.

Não vejo nenhum defeito em ser assim, se é que sou assim. E por isto, quase sempre falo de amigos, de lugares, de lembranças. É uma característica de cronista, espectador do tempo e da vida. Não faz mal a ninguém.

Conheci Osório no desaparecido Bar Potiguar, em Chorrochó. Nossa convivência começou ali. A propósito, transcrevo uma crônica que já foi publicada mais de uma vez neste mesmo blog. Ei-la:

Toda cidade, seja metrópole ou do interior, tem o seu ponto de encontro. São famosos, em todas as cidades, os bares frequentados por artistas, jornalistas, políticos, intelectuais, escritores e gente que a fama não alcançou. Conheço alguns, vários.

Chorrochó, minúscula cidade do sertão baiano, também tinha o seu mais famoso ponto de encontro: o bar Potiguar. Central, arejado, convidativo.

Na segunda metade da década de 1960 lá despontou – e durou por muito tempo – uma espécie de sociedade irrequieta, formada de jovens, geralmente estudantes do então Colégio Normal São José, que fazia uma cidade alegre e hospitaleira. Esses jovens, a maioria proveniente da zona rural, construíram, dentro de seus limites interioranos possíveis, um mundo entrelaçado de fantasia e realidade.

O bar Potiguar, hoje desaparecido, era o ponto de encontro desses jovens, ávidos por atingir seus sonhos e propensos, todos eles, a trilharem o caminho do futuro em busca dos seus ideais.

A boemia se tornou uma sadia forma de agregação de amizades que perduraram. Muitas dessas pessoas hoje são profissionais, preocupadas com tempo e objetivo, mas inarredavelmente ligadas àquele passado de ternura e convivência responsável.

Sobressaíam-se, naquele tempo, nesse ambiente de amizade e cordialidade, uns mais jovens, outros mais experientes, como assíduos frequentadores do bar Potiguar: Juracy Santana, Antonio Euvaldo Pacheco de Menezes, Francisco Ribeiro da Silva, José Osório de Menezes, João Bosco de Menezes, Neusa Maria Rios Menezes, José Juvenal de Araújo, Antonio Wilson de Menezes, Geraldo José de Menezes, Maria Lenisse Oliveira Alves de Santana, Almira Marques Ribeiro, Eremita Marques Ribeiro, Antonia Marques Ribeiro, Marinalva Araujo, Raimunda Ribeiro Coelho, Ângela Maria Silva, Carlos Bispo Damasceno, Fabrício Félix dos Santos, Ernani do Amaral Menezes, José Eudes de Menezes, José Claudionor Menezes, José Evaldo de Menezes, Francisco Afonso de Menezes, José Jazon de Menezes, Antonio Cordeiro de Menezes, Antonio Geraldo Rodrigues de Menezes e tantos outros, alguns já falecidos.

A lista é extensa, mas limito-me a alguns nomes para evitar um massacre maior da saudade. E havia, de quando em vez, a frequência dos mais velhos, que nos deixavam mais seguros e nos amparavam em nossas fragilidades de jovens inexperientes: Eloy Pacheco de Menezes, Horácio Pacheco de Menezes, José Calazans Bezerra, Luiz Pacheco de Menezes, Francisco Arnóbio de Menezes, José Pires Filho, Joviniano Cordeiro de Menezes, etc. 

Surgiam presenças fortuitas e rápidas, a exemplo de Dorotheu Pacheco de Menezes. Virgílio Ribeiro de Andrade era dono do Potiguar e responsável por agregar todas essas pessoas. Ágil, atencioso, exemplo de anfitrião.         

Qual a importância dessas lembranças? A resposta talvez esteja na certeza de que foram essas pessoas que sustentaram, naquele tempo, em Chorrochó, a melhor escola que se possa ter na vida: a amizade.

araujo-costa@uol.com.br

 

                  

 

                  

Deixe um comentário