Sugestão indecente

Um amigo de Patamuté – creiam, ainda tenho amigos por lá – estava em Juazeiro, telefonou-me, fez uma pergunta indecente: por que não me candidato a qualquer cargo em Curaçá? Vereador, por exemplo?

Disse-lhe que somente me arriscaria, se vereador ou qualquer exercente de cargo público trabalhasse de graça, sem salário, sem mordomias, sem benesses e sem outros penduricalhos mais, que deixam o indivíduo com o rei na barriga.

A negativa não quer dizer que não preciso de dinheiro. É exatamente porque não tenho dinheiro, por ser um pé-rapado, que não me meto mais em casa de marimbondo.

Ser político fazia parte de meus sonhos de jovem utópico. Delírios da juventude. Todo mundo pode derrapar na vida. Escorregões são naturais.

Quando o sujeito entra na política, mesmo que seja rico e honesto, passa a ser larápio na boca do povo. E até com razão, em certas circunstâncias. O povo é sábio.

Além do mais, disse ao meu amigo: já sou idoso, segundo fiquei sabendo. Não me meto mais em enrascada.

Notei mesmo que sou idoso por acaso e não observando a cédula de identidade. Dia desses, entrei numa repartição pública em São Bernardo do Campo e na recepção se formava uma fila, como, aliás, em todo lugar que se vai.

Uma senhora, já pra lá de Bagdá, lançou-me um olhar de dó e desprezo e imediatamente dirigiu-se ao atendente:

– “Deixe esse senhor passar na minha frente”.

Fiz uns salamaleques, agradeci a gentiliza e me lembrei de dizer a surrada e idiota frase: “primeiro as damas”.

– “Imagine! Eu estou bem”, disse ela.

Noutras palavras, ela quis dizer mesmo que estou um caco. Comecei a me preocupar. Mas não há de ser nada. Não estou assim tão moribundo.

Todavia, voltando ao assunto da candidatura sugerida, houve um tempo, em que vereador não tinha salário ou vencimentos, qualquer que seja a denominação. O edil representava o povo de verdade, diferentemente de hoje, que cuida mais dos próprios bolsos.

Há alguns anos, pensei em cutucar os vereadores do Brasil pra ver se eles gostavam mesmo do povo ou dos subsídios.

Sem nenhuma maldade, conversei com um amigo deputado federal e lhe sugeri que apresentasse um projeto de lei na Câmara dos Deputados retirando os subsídios dos vereadores a partir da aprovação da medida legislativa, se aprovada fosse.

Os vereadores passariam a ser voluntários, filantrópicos, piedosos, defensores arraigados de  seus redutos eleitorais.

Não tive êxito em minha empreitada. Meu amigo deputado foi rápido.

– Que é isso, rapaz? Você quer acabar com minha carreira política? E minhas bases?”

Deixei pra lá. Ficou o dito pelo não dito.

araujo-costa@uol.com.br

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