“Os deputados e senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos” (artigo 53, da Constituição Federal)
Em 1966, Márcio Moreira Alves (1936-2009), jornalista do Correio da Manhã, foi eleito deputado federal pelo MDB da Guanabara.
Em 02 de setembro de 1968, Márcio Moreira Alves fez um pequeno discurso na chamada sessão pinga-fogo da Câmara dos Deputados e, dentre outras inofensivas bobagens, sugeriu às moças da época uma espécie de boicote: que elas não namorassem nem dançassem com cadetes e jovens oficiais, porque eles faziam parte da ditadura.
O governo militar se sentiu ofendido e pediu para o Supremo Tribunal Federal processar o jovem e afoito deputado da Guanabara.
Naquele tempo, o Supremo Tribunal Federal era supremo mesmo. Seus ministros não andavam por aí tagarelando diante das câmeras de televisão, nem saiam correndo atrás de jornalistas para conceder entrevistas.
Hoje é mais fácil encontrar um ministro do Supremo num estúdio de televisão ou numa redação de jornal do que em seu gabinete no STF.
O STF pediu licença à Câmara dos Deputados para processar Márcio Moreira Alves, mas a Câmara negou.
Começou aí o estopim que deu o ponta pé no endurecimento do regime militar.
Em 13 de dezembro de 1968, o marechal-presidente Arthur da Costa e Silva reuniu os ministros no Palácio das Laranjeiras e editou o Ato Institucional número 5 (AI-5).
O resto da história e a escuridão política todo mundo conhece.
Mas o que lembro aqui é a contradição do pensamento da esquerda do Brasil. Muitos dos seus integrantes em 1968 continuam vivos, graças a Deus.
Na discussão em plenário, para decidir se a Câmara dos Deputados deveria ou não conceder a licença para o STF processar Márcio Moreira Alves, a esquerda argumentou com unhas e dentes, que o parlamentar é inviolável em suas opiniões, palavras e votos.
O preceito estava na Constituição de 1967, então vigente. Está na Constituição de 1988, em vigor.
Portanto, a esquerda estava certa. Processar um parlamentar em razão da expressão do seu pensamento é uma violência inaceitável em qualquer regime político, seja ele democrático ou não.
Pois bem. Agora dá-se o inverso. A esquerda diz que deputado deve ser processado por suas opiniões. Dá para acreditar?
O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), na mesma condição parlamentar de Márcio Moreira Alves, andou falando umas besteiras por aí e, dentre essas besteiras, disse que se a “esquerda radicalizar” terá que ser editado um novo AI-5.
Lorota. Força de expressão, talvez. O Brasil é outro. Não há espaço para isto. Não há como fazer isto.
Mas toda a esquerda se alvoroçou e alguns partidos políticos até já pediram a cassação do deputado Eduardo Bolsonaro.
A ditadura cassou o deputado Márcio Moreira Alves por ter expressado sua opinião. A mesma esquerda, que resistiu bravamente ao ato da ditadura militar, hoje quer cassar o mandato do deputado Eduardo Bolsonaro, pelo mesmo motivo: ter expressado sua opinião.
Pelo que se vê, a esquerda do Brasil gosta mesmo é de dinheiro. Apeada do poder pelas urnas de 2018, esqueceu-se de 1968, quando defendia a inviolabilidade dos deputados.
Hoje a esquerda diz que não há inviolabilidade de deputado coisa nenhuma, desde que o deputado seja da direita.
Os demagogos da esquerda disputam entre eles o troféu cara de pau.
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