Distorções à esquerda

A cineasta Petra Costa, magnata e herdeira da Construtora Andrade Gutierrez, costurou uma história frágil e nebulosa ao produzir o documentário Democracia em vertigem, indicado ao Oscar.

O documentário é uma inequívoca propaganda do PT com o intuito de disseminar no exterior a fantasiosa versão de que Lula da Silva e Dona Dilma Rousseff foram perseguidos por autoridades e instituições do Brasil.

Os petistas se alvoroçaram com a possibilidade de o documentário ganhar a estatueta americana. Se o filme tivesse sido vitorioso, eles teriam atingido o orgasmo político.

O documentário dá ênfase às imagens de Lula da Silva em abril de 2018, no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, antes de ser preso.

Pessoas atentas já diziam naqueles dois dias, em São Bernardo do Campo, que a enrolação de Lula antes de se entregar à Polícia Federal era para que as imagens corressem o mundo numa espécie de denúncia. Dito e feito: a cineasta petista usou as imagens no documentário, ad nauseam.

Mas a Academia de Hollywood não engoliu a bazófia petista. A história mal contada no documentário pode ter servido para muita coisa, menos para convencer os jurados.

Depois do fiasco, jornalistas lulistas dizem que a Academia de Hollywood analisou somente os critérios técnicos do documentário e por isso o filme perdeu o Oscar. Risível.

O documentário, por óbvio, também teve o intuito de resgatar a história da Construtora Andrade Gutierrez, que pertence à família da cineasta. Uma tentativa mal sucedida de afastar a construtora dos escombros dos escândalos de corrupção dos governos petistas, incursão na Lava Jato, etc.

Empurrando-se a esquerda para um lado e a direita para outro, ambas comumente exaltadas, o cerne da discussão deve cingir-se ao óbvio: a fragilidade da narrativa da cineasta petista arranhou a história. Omitiu fatos, camuflou outros, deturpou o caminho da verdade política.

Nas entrelinhas, o documentário deixa entender que Dona Dilma Rousseff caiu porque não concordou com os banqueiros. Lorota. O ministro da Fazenda de Dilma, Joaquim Levy, foi indicado pela presidência do Bradesco. Quadro abalizado do banco, Levy fazia parte da superintendência da instituição.

Em nenhum momento a cineasta petista diz que o vice Michel Temer foi criteriosamente engendrado por Lula da Silva para compor a chapa presidencial de Dilma Rousseff por duas vezes seguidas. Logo, farinha do mesmo saco. Lula o empurrou goela abaixo de Dilma, porque Temer fazia parte das estratégias nem sempre confessáveis do ex-presidente.

Outro equívoco da cineasta: os movimentos que tomaram as ruas foram minimizados, de sorte que o documentário deu a entender que a sociedade estava satisfeita com o governo Dilma e que sua queda deu-se unicamente em razão de um golpe adrede estudado para tomada do poder, um complô da direita.

O documentário omitiu, certamente de propósito, que o processo jurídico-político do impeachment foi presidido pelo ministro petista do Supremo Tribunal Federal, Enrique Ricardo Lewandowiski, que rasgou o mandamento constitucional segundo o qual o presidente afastado fica inelegível por oito anos.

Lewandowiski construiu às escondidas, com o PT, uma tese esdrúxula e criou um precedente: permitiu que dona Dilma Rousseff perdesse o mandato, por vontade do Congresso Nacional, mas não perdesse o direito de disputar eleições. Isto não está na Constituição da República.

Assim, Dilma disputou uma vaga ao Senado Federal por Minas Gerais em 2018, mas os espertos mineiros não a conduziram à casa legislativa tal como queria Lewandowiski.

Lewandowiski e o PT ficaram com cara de galo. Os mineiros disseram não.

O documentário estendeu as razões do impeachment à ascensão do presidente Jair Bolsonaro ao poder. Outra ingenuidade. A vitória de Bolsonaro nas urnas de 2018 foi consequência do fragilizado período petista.

Democracia em vertigem nada acrescenta à história democrática do Brasil.

Um aprendiz de cineasta teria feito melhor, com uma vantagem: contado a verdade, sem distorções à esquerda.

O fato é que o documentário recheado de críticas da direita e elogiado pela esquerda não levou o Oscar.

Mas o nome do Brasil estava lá. Pena que a cineasta o tenha apequenado.

araujo-costa@uol.com.br

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