A Justiça e o retrato da arrogância

Um patusco desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo cometeu, mais de uma vez, na cidade litorânea de Santos, atos repugnantes de arrogância explícita.

Em duas ocasiões, filmado em ambas, o desembargador se desentendeu com agentes municipais e, numa delas, se recusou a usar a máscara, que é obrigatória, por decreto estadual e regras do município de Santos, neste tempo de pandemia.

Funcionário graduado da elite do Estado de São Paulo, o desembargador recusou-se a cumprir ordem legal emanada do próprio Estado, que paga seus estratosféricos vencimentos e lhe sustenta as mordomias que, convenhamos, ele não merece. E se recusou, também, a obedecer norma legal da Prefeitura de Santos.

Média dos vencimentos mensais de Sua Excelência no primeiro semestre de 2020: R$ 55 mil. Este é o valor mensal da arrogância que a sociedade paulista sustenta.

O magistrado que manda cumprir a lei, não a cumpre, recusa-se a cumprir.

Numa ocasião, o desembargador rasgou a multa aplicada pelo agente público e, num ato de arrogância e prepotência, jogou-a ao chão. De outra feita, ameaçou telefonar para altas autoridades, com o intuito de intimidar o guarda municipal, o que, por óbvio, não adiantou.

Conduta mesquinha, desprezível, idiota. Ademais, o desembargador ofendeu o agente público, chamando-o de “analfabeto”, embora ser analfabeto não signifique nenhum demérito para qualquer cidadão. Mas ficou clara que a intenção do magistrado foi menosprezar o guarda municipal.

Como se não bastasse ao apoucado raciocínio de Sua Excelência, ele ainda se valeu de seguidas “carteiradas”, dizendo-se ser pessoa importante e ostentando sua condição de autoridade o que, neste caso, pouco ou nada importa.

Todos são iguais perante a lei e ele, na condição de magistrado, deveria dar o exemplo, mas sua pequenez não lhe deixa saber disto, que qualquer pessoa do povo sabe.

Ao contrário, o desembargador apequenou-se. Mais do que isto, assumiu sua condição de nanico diante da grandeza do agente público que o multou, dentro da lei e cumpriu o seu dever.

Claro, neste caso, o retrato da arrogância, que mancha a magistratura, quer paulista, quer nacional.

Aliás, o Tribunal de Justiça paulista precisa ficar mais atento com a conduta de seus magistrados e deixar de lado o exacerbado corporativismo.

Um parêntese, só para lembrar:

Em data recente, um juiz paulista foi flagrado surrupiando garrafas de água do fórum onde trabalha, acondicionando-as em mochila e levando-as para sua casa. Fazia isto costumeiramente, até a prática ser descoberta.

Se essa conduta tivesse sido praticada por um pobre, sem voz, o Tribunal de Justiça paulista o acusaria de furto, mas como é juiz, a prática reprovável do magistrado foi entendida apenas como um escorregão de Sua Excelência, que resultou em prejuízo ao tribunal.

Presume-se que, em quadro assim, cabe, no máximo, uma repreensão. Se fosse um pobre, xilindró nele e lhe seria colocada a mancha de perigoso e incompatível para o convívio em sociedade, et cetera e tal.

O Tribunal de Justiça acabou descobrindo outra prática do juiz que surrupiava água do forum: ele não proferia as decisões processuais, mas pedia para seus auxiliares redigirem. Juiz indolente, sequer fazia seu dever precípuo, qual seja o de exercer dignamente a judicatura.

Mas voltando ao caso do arrogante, prepotente e indecente desembargador paulista, tanto o Corregedor Nacional de Justiça quanto o Tribunal de Justiça de São Paulo já se manifestaram no sentido de apurar o caso.

Apurar o quê? Está gravado, cristalinamente demonstrado, a imprensa mostrou ao mundo inteiro. Basta punir o mentecapto desembargador.

Entretanto, qualquer pessoa do povo sabe, de antemão, qual será o resultado desse procedimento investigatório disciplinar: nenhum, absolutamente nenhum. Quiçá o arquivamento, exceto se novos ventos estejam a soprar em direção ao Judiciário.

Esse desembargador já aprontou outras patacoadas conhecidas. Apesar das denúncias, todas foram parar no limbo. O Tribunal de Justiça de São Paulo deu de ombro. A diferença é que nas outras vezes não tinham sido gravados os destemperos do magistrado.  

No Judiciário há casos mais graves, a exemplo de magistrados corruptos, que são “punidos” com robustas aposentadorias. Há inúmeros casos neste vasto Brasil, em que a sociedade sustenta, vitaliciamente, com os impostos que paga, os desvios morais de magistrados. Para muitos deles, o crime compensa.

Se o Conselho Nacional de Justiça, as corregedorias estaduais e os tribunais de Justiça atuassem, com rigor, contra esses pequenos juízes, certamente eles seriam em menor número. 

Em nossa República abundam os mentecaptos, os néscios, os apequenados, os insignificantes, os insensatos. Eles são muitos e aumentam a cada dia.

araujo-costa@uol.com.br  

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