Rabiscos políticos e pré-candidaturas

“Conversei longamente com o governador. A cada pergunta, ele dava uma resposta de cinco minutos, a mulher tomava a palavra e falava vinte, trinta minutos”. (Sebastião Nery).

A mulher que mandava no marido – e no governo do marido – era a primeira-dama do Ceará, elegante senhora de respeitável estirpe coronelista.

O marido era o professor Parsifal Barroso (1913-1986), governador eleito em 1958 pelo PSD, ex-ministro do Trabalho de Juscelino Kubitscheck.

Surgiu um ruído, segundo o qual, quem mandava no Ceará era a mulher do governador e não o governador.

Sebastião Nery, jornalista de A Tarde, de Salvador, farejou a notícia e captou o sucesso da reportagem.

Nery foi lá ver, in loco. Andou, conversou, entrevistou, assuntou, anotou, convenceu-se.  

De volta a Salvador, A Tarde deu a manchete: “Quem manda no Ceará é a mulher de Parsifal”. Um jornal cearense reproduziu a notícia.

O Ceará virou um rebuliço. O governo ficou bravo e a oposição contente com a notícia, que todo mundo no Ceará sabia, mas ninguém se arriscava a dizer.  

O assessor de imprensa do governador mandou um telegrama para Sebastião Nery: “Jornalista Sebastião Nery, venha morrer no Ceará”.

Sebastião Nery, respondeu com outro telegrama: “Não vou”. E não foi.

Sebastião Nery conta a história in A Nuvem (Geração Editorial, São Paulo, 2009).

Lembrei-me deste fato, porque, nestes tempos de conturbadas e vaidosas pré-candidaturas municipais, fontes me informam que em Chorrochó, simpático e querido município do sertão da Bahia, nas bandas do sertão do São Francisco, há um aspirante a cargo eletivo que segue à risca as ordens da mulher.

Dizem que a mulher conjectura, engendra acordos políticos, indica nomes, amaldiçoa outros, antevê dias melhores (para o lado dela, é claro) e por aí vai.

O marido faz muito bem em curvar-se às ordens da mulher. Quem sabe, sendo eleito, Chorrochó melhora e sai desse mandonismo insensato que se arrasta há décadas e que muitos discordam, mas esses muitos não conseguem mudar, não têm capacidade de mudar.

Falta-lhes coragem, escapa-lhes experiência política, sobra-lhes comodismo.

É antológica a frase do poeta modernista Menotti Del Picchia (1892-1988): “Quem não muda deixa de ser”.

Chorrochó não muda e, por isto, não está sendo.

A opinião feminina é de grande valia, qualquer que seja o contexto, inclusive em política.

Mas tudo que é demais acaba não sendo bom, inclusive opinião.

araujo-costa@uol.com.br

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