O Brasil é o único país do mundo em que seu serviço secreto não é secreto.
A única exceção deu-se no período dos governos militares, que herdaram a estrutura do Serviço Federal de Informações e Contrainformações (SFICI).
O temido Serviço Nacional de Informações (SNI) criado em 1964 pelo general Golbery do Couto e Silva era, de fato, secreto, funcionava e tinha o objetivo de cuidar das atividades de informações e contrainformações herdadas com a estrutura do SFICI.
Os governos militares mantiveram em todos os ministérios, inclusive nas repartições federais sediadas nos estados, a chamada Divisão de Segurança e Informações (DSI), braço forte e seguro do SNI, que também funcionava nos órgãos de administração direta e indireta.
Noutras palavras: os presidentes militares e seus ministros eram bem informados.
A esculhambação começou em 1990, quando Fernando Collor de Mello tomou posse como presidente da República.
Antes de cair em desgraça, Collor extinguiu o SNI e criou, em substituição, a Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE), que absorveu a estrutura do órgão extinto. Nomeou um jovem amigo de boemia para administrá-la.
Experiência do amigo, que Collor nomeou para chefe do serviço secreto: profissional da construção civil e criador de camarões. Devia saber tudo de cons trução e criação de camarões e nada de informações.
Não podia dar certo. O serviço secreto de Collor não protegia nem o próprio presidente da República.
Em 1999, o presidente Fernando Henrique Cardosos criou a Agência Brasileira de Inteligência (ABIN), que existe até hoje. Uma piada.
Funções legais da ABIN: “investigar ameaças reais e potenciais, bem como identificar oportunidades de interesse da sociedade e do Estado brasileiro, e defender o estado democrático de direito e a soberania nacional”.
A julgar pelo que o presidente Bolsonaro andou falando no Palácio do Planalto, o serviço de inteligência brasileiro desconhece o que acontece no Brasil.
A ABIN foi incapaz de detectar que o dono do conglomerado JBS entrasse no Palácio do Jaburu, residência oficial do presidente Michel Temer, tarde da noite, com um gravador e gravasse toda a conversa com o presidente da República.
O empresário gravou a conversa e saiu do Palácio do Jaburu, pomposo, como havia entrado.
Por outro lado, o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), que cuida da segurança presidencial – e trabalha em estreito vínculo com a ABIN – não o revistou e nenhum equipamento detectou a geringonça.
Assunto para humorista.
Esse episódio quase derrubou o presidente Michel Temer.
As demais trapalhadas da ABIN são de conhecimento público.
Agora, no governo Bolsonaro, a situação degringolou. A presidência da República desconhece o que está acontecendo no Brasil e é de interesse de Estado e de Governo.
Por quê? Supõe-se que lhe falta um serviço de inteligência ao menos razoável.
Escândalo recente escancarou a ineficiência do serviço de inteligência brasileiro: supostos investigados descobriram que estavam sendo monitorados pelo Ministério da Justiça. Conheciam até os relatórios reservados.
Fato comum em todos os governos, só no governo Bolsonaro o assunto veio a público, exatamente por falha nos serviços internos de informações.
Desmentido aqui, outro acolá, certo é que o problema foi parar no Supremo Tribunal Federal e desgasta sobremaneira o governo.
Os senhores ministros do STF devem estar dando sonoras gargalhadas das trapalhadas do serviço secreto do Brasil.
Em resumo: o serviço secreto do Brasil não é secreto.
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