Os prefeitos e a pandemia

Perguntar não ofende. Ou ofende?

O conhecido radialista José Nello Marques, renomado professor de jornalismo, diz que perguntar ofende. E ofende quando a pergunta é  imbecil e desnecessária.

Exemplo de pergunta desse tipo, que constrange qualquer jornalista sério: num enterro, a repórter do programa policial de televisão pergunta à mãe do falecido: “como a senhora está se sentindo? ”

Vou fundamentar minha pergunta, que farei no final.

Antes do prazo previsto na legislação eleitoral, para o início da campanha, todos os prefeitos, principalmente aqueles que disputam a reeleição, foram freneticamente às televisões, imprensa em geral e redes sociais, para pedir “fique em casa”, “use máscara” e “evite aglomeração”. Mais: fizeram normas duras, rígidas, toque de recolher, barreiras sanitárias, confinamento social, etc.

Não estavam errados.

Suas Excelências apareciam em lives, falando pelos cotovelos e explicando medidas urgentes e necessárias, que hoje se sabe, não se esforçam para fazer cumpri-las.

Todavia, depois que a campanha eleitoral começou, esses mesmos prefeitos fazem carreatas e outros eventos, escandalosamente incompatíveis com as normas que eles próprios editaram. Nem mesmo parte de seus admiradores usam máscaras e as imagens que se vê são esclarecedoras. Mais do que isto, assustam.

Talvez, em certas situações, nem os candidatos obedecem às normas que eles fizeram.

Os jornalistas sabem – e principalmente os jornalistas independentes, que não são pagos para elogiar este ou aquele governante – que o covid-19 está aí implacável, assustadoramente implacável.

Profissionais de saúde que estão no batente atestam que todos os dias pessoas são internadas, muitas morrem e os prefeitos estão silentes, descaradamente silentes e até, em certos casos, omitindo as informações da população através das chamadas subnotificações.

Fácil explicar: se não há pessoas nas ruas, como os candidatos vão distribuir santinhos, fazer demagogia, “adesivaços”, promessas, exibir bandeiras partidárias, encher os ouvidos da população dessas insuportáveis propagandas em carros de som?

O prefeito de São Bernardo do Campo, em São Paulo, foi às redes sociais esta semana para dizer que a pandemia no município está “estável”. Aliás, muitos prefeitos estão dizendo isto.

E daí? A estabilidade dos números da doença significa descuidar-se, relaxar as normas de combate ao coronavírus?

Estabilidade significa dizer que as autoridades devam fechar os olhos para a cruel realidade durante a campanha eleitoral?

O fato é que nessa campanha veem-se multidões em qualquer lugar e a qualquer hora.

Cabos eleitorais abundam distribuindo propagandas a mando dos candidatos, até porque muitos precisam ganhar seu sustento, o que não está aqui em discussão. A discussão é sobre o afrouxamento das normas de prevenção da disseminação do vírus..

Anote aí, o leitor.

Quando se fecharem as urnas de 15 de novembro, não se surpreenda se esses mesmos prefeitos hipócritas voltarem aos meios de comunicação para dizer “use máscara, fique em casa, evite aglomeração”, mesmo porque não há vacinas nem cura para essa doença, por enquanto.

Mas por enquanto, é conveniente para esses políticos ficarem quietos, irresponsavelmente quietos.

É possível acreditar nesses políticos irresponsáveis?

araujo-costa@uol.com.br

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