O cronista Rubem Braga dizia que “depois de certa idade, uma das seções do jornal que a gente lê com mais interesse é a dos mortos”. São os obituários.
Nas seções de falecimentos dos jornais estão nomes completos dos falecidos, famílias a que pertenciam, cemitérios e informações sobre funerais, datas da missa e outras coisas mais.
Como se vê, além de outros infortúnios, a senilidade traz alguns hábitos que, na mocidade, sequer sabíamos da existência deles: ler os obituários com o intuito de sabe se algum conhecido partiu desta para a melhor.
Chega um tempo em que nem conhecidos mais chegados temos mais, todos já se foram e os obituários não têm importância nenhuma.
O escritor Rubem Braga viveu noutro tempo mais ameno, até na velhice.
Os obituários não são mais lidos com a frequência costumeira, em razão, dentre outras, do amontoado de notícias ruins.
O coronavírus está matando implacavelmente centenas por dia, milhares em todo mundo, muito mais do que as autoridades publicam a conta-gotas, para não inflarem os números de mortes diárias.
Nesta triste fase por que passamos, já perdi alguns amigos e outros se encontram acometidos dessa terrível doença, o covid-19. O futuro cada vez mais se torna uma incógnita, um enigma inalcançável.
Estamos em tempo de reflexão. O sentido da vida e da morte cada vez mais se torna indecifrável.
Neste período difícil, uma das primeiras pessoas queridas que a pandemia levou foi um amigo de décadas, José Evaldo de Menezes.
Advogado e político, essencialmente amigo, José Evaldo deixou um vazio que não se pode mensurar.
José Evaldo era um esteio, uma segurança que eu tinha, embora distante. Com sua morte, desmoronou-se a construção da amizade por inteiro e passei a conviver com os escombros da saudade.
Volto ao hoje.
A angústia é saber que todos os dias a humanidade está cada vez mais cruel e indiferente.
É comum encontrarmos, no dia a dia, pessoas preocupadas somente com fama, poder e dinheiro. Para essas pessoas, nada mais existe em torno delas.
Uma coisa puxa outra, a conversa também.
Outro dia vi uma cena, difícil de esquecer. No balcão de uma instituição, estava um senhor acometido de grave doença, visivelmente alquebrado, saúde em pandarecos, discutindo arrogantemente sobre irrisória quantia de uma taxa que se negava a pagar, porque exorbitante, segundo ele.
Ou seja, naquele estado deplorável e com pouco tempo presumível de vida, aquele senhor estava preocupado com dinheiro.
Deu-me um ímpeto de lembrar àquele senhor que caixão de defunto não tem gaveta. Ele vai, o dinheiro fica, talvez para alimentar discórdia entre os herdeiros.
Pra que se preocupar com dinheiro a essa altura da vida, já no despenhadeiro do tempo, precipitando-se em direção à morte?
Mas me aquietei. O problema era dele e não meu.
Imaginei como teria sido esse arrogante senhor, quando mais novo e sem problema de saúde.
Precisamos rezar para diminuir os obituários e aplainar as tristezas.
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