O jornal O Estado de S.Paulo publicou matéria cabeluda e bem fundamentada, segunda a qual existe no Congresso Nacional um orçamento secreto da ordem de R$ 3 bilhões, manuseado por deputados e senadores, de acordo com suas conveniências políticas.
Diz a matéria que esse orçamento foi engendrado pelo presidente da República para beneficiar aliados e manter sua base parlamentar nas duas casas do Congresso Nacional. Noutras palavras: comprar apoiadores.
Partindo desse pressuposto, é através desse orçamento sigiloso e paralelo, que corre longe das vistas dos contribuintes, que o governo afaga parlamentares de ideias flexíveis – ou vazios de ideias – aqueles que mudam de lado a qualquer tempo e votam de acordo com a quantidade de “cascalho” que escorrega em seus bolsos.
A situação faz lembrar o tão conhecido mensalão do Partido dos Trabalhadores (PT), que abastecia parlamentares corruptos com dinheiro público e que Lula da Silva não sabia, não queria saber e tinha raiva de quem sabia. Mas apoiava.
A história é longa.
Em resumo, dá-se o seguinte:
O governo federal reserva uma estratosférica bufunfa para agradar os parlamentares que andam dizendo por aí que votam contra o governo, mas mudam rapidamente de ideia tão logo o Palácio do Planalto lhes faça um cochicho ao pé do ouvido.
Deputados e senadores adoram conversa ao pé do ouvido, principalmente se a conversa for nebulosa.
Um parêntese: outro dia o espevitado senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), pernambucano de Garanhuns radicado no Amapá, disse que, no seu entender, o político que mentir nas dependências do Senado Federal deve ser preso. Pelo jeito o senador Randolfe quer fechar o Congresso Nacional por falta de políticos.
O senador Randolfe Rodrigues se acha o suprassumo da honestidade, embora ostente, além da vontade de aparecer diante dos holofotes, um passado político não muito claro. Deve ser discípulo de Lula da Silva.
Voltando ao caso do orçamento secreto. Na Bahia, por exemplo, o deputado federal Charles Fernandes Silveira Santana (PSD) de Guanambi, da mesma turma do rico senador Ângelo Coronel (PSD), direcionou sua parte do dinheiro previsto nesse orçamento secreto a uma associação beneficente para comprar uma retroescavadeira e até disse o preço que a tal associação teria de pagar pela geringonça: R$ 300 mil.
Estranho aí é que foi o deputado que deu o preço da retroescavadeira e não o fornecedor que vendeu.
Ocorre que o preço da máquina se situava por volta de R$ 250 mil. Com o restante – R$ 50 mil – não se sabe exatamente o que Sua Excelência fez ou faria, se o caso não tivesse vindo à tona.
Essa perigosa conversa de comadres envolvendo dinheiro público passa, necessariamente, pelo Ministério do Desenvolvimento Regional que obedece a ordens dos políticos que mandam na Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e Parnaíba).
Na prática, os parlamentares recebem o dinheiro do governo federal e o direcionam para o Ministério de Desenvolvimento Regional que, por sua vez, manda desaguar na Codevasf e esta adquire tratores, caminhões pipa e retroescavadeiras para uso político de apadrinhados desses parlamentares (prefeitos, vereadores, líderes políticos) nos municípios que compõem seus redutos eleitorais.
O pior é que essas máquinas nem sempre são bem cuidadas pelos prefeitos. Há casos em que a manutenção não é feita regularmente e outros casos em que, para limpar uma barragem ou aguada, o beneficiário tem de comprar o óleo diesel para que a máquina possa fazer o serviço.
Em Petrolina (PE) manda na Codevasf o senador Fernando Bezerra Coelho (MDB), líder do governo no Senado da República, que recebeu R$ 125 milhões e indicou Aurivalter Cordeiro para superintender a retro aludida companhia estatal.
Em Juazeiro (BA), manda na Codevasf o deputado Elmar Nascimento (DEM) que, salvo melhor juízo, indicou Marcelo Moreira e José Alselmo Moreira Bispo para comandarem a companhia por lá.
Com o intuito de ajudar esses políticos de ideias frouxas, os governos deram um jeitinho e alargaram legalmente a área de atuação da Codevasf, que hoje abrange 2.675 municípios espalhados por 15 estados e distrito federal.
Até no Amapá, Pará e Mato Grosso a Codevasf atua. Em Macapá – parece – a estatal terá uma superintendência comandada por apadrinhado do senador David Alcolumbre (DEM), aliado do governo Bolsonaro.
Do alto de minha ignorância, confesso que não sabia que os estados do Amapá, Pará e Mato Grosso fazem parte dos vales do São Francisco e do Parnaíba.
Mas dinheiro público nas mãos de políticos espertos muda até a geografia do Brasil.
araujo-costa@uol.com.br