Criada e instalada sob a égide de boa e necessária causa, qual seja, a investigação direcionada aos erros, omissões e negligências do governo federal no combate à pandemia do coronavírus, a CPI se enveredou, no meio do caminho, pela vaidade de alguns de seus integrantes.
Algumas vezes a CPI perdeu tempo ao enaltecer supostas qualidades de seus membros, talvez tentando criar um álibi para amparar senadores sabidamente corruptos que, ao assumirem a CPI, de repente, num passe de mágica, passaram a ser “honestos”.
Ficou patente que a CPI se desviou do foco, do caminho, do objetivo. Mas construiu alguns resultados positivos, não há porque negar.
Numa das sessões, a CPI cedeu a cadeira da presidência para que o senador Fábiano Contarato (Rede-ES) fizesse a veemente e inoportuna defesa de sua condição de homossexual e da classe LGBTQIA+ que, diga-se de passagem, ninguém é contra que se faça, desde que no foro apropriado.
Os gays têm instituições e instâncias para reivindicarem seus direitos e sustentarem sua condição em sociedade, inclusive, dentre outras e tantas, o Congresso Nacional, sem preconceito e discriminação.
Contudo, a CPI do Senado não foi criada para esse fim.
Pergunta-se: O que a condição de gay do senador Fabiano Contarato tem a ver com erros, omissões, negligências e irresponsabilidades do governo Bolsonaro no combate à pandemia?
De outra feita, a CPI gastou tempo discutindo se convocaria ou não a ex-mulher do presidente da República para depor sobre a prática de rachadinhas por membros da família Bolsonaro.
Pergunta-se: O que as rachadinhas, que devem ser seriamente investigadas pela polícia judiciária e Ministério Público têm a ver com erros, omissões e negligências do governo Bolsonaro no combate à pandemia?
Por outro lado, membros da CPI, na ânsia de se cacifarem em seus estados, para as eleições de 2022, descaradamente usaram a CPI para fins político-eleitorais.
Há exemplos claros, inegáveis, cristalinos. Cito apenas alguns.
Na Bahia, o espalhafatoso Otto Alencar (PSD-BA), exemplo de atuação opaca no Senado, que termina o mandato em 2022, articula-se com Lula da Silva e o senador Jaques Wagner (PT) para garantir sua reeleição ao Senado Federal, de modo que o entrave, até agora, é saber se o governador Rui Costa (PT) cederá sua vez natural para Otto.
Com o fim do mandato de governador, Rui Costa é o nome mais natural e apropriado para disputar uma vaga no Senado Federal, mas isto depende dos conchavos locais para a eleição de Lula e a continuidade do PT no poder na Bahia.
Se Rui Costa concordar em ceder a vez, Otto Alencar terá se servido da CPI para beneficiar-se politicamente. Aliás, foi o que ele mais demonstrou lá.
Para sair-se bem de sua atuação pífia no Senado, Otto Alencar não precisava apequenar-se na CPI da Pandemia. Bastava tomar algumas lições de sabedoria política com Jaques Wagner, carioca que entende tudo de malandragem política e sabe o momento certo de falar.
O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE), que foi delegado-geral de política de Sergipe e está em primeiro mandato, parece que ainda não foi contaminado pela política rasteira e sem pudor, embora já se tenha declarado candidato a presidente em 2022.
Alessandro Vieira, por enquanto, continua sensato e discorda do relatório final da CPI, elaborado por Renan Calheiros (MDB-AL). Renan quer pedir o indiciamento de dois filhos do presidente da República, dentre outras medidas.
Numa referência aos filhos do presidente, o senador Alessandro Vieira ponderou que “ser babaca não é crime. Falar coisas estúpidas também não” e deixou patentemente demonstrado que a intenção de Renan Calheiros é usar politicamente a CPI para se promover ou, pelo menos, amenizar o resultado de seus inúmeros inquéritos em andamento no STF, a maioria por corrupção e lavagem de dinheiro.
Ninguém tenha dúvida de que o STF o absolverá em todos, se chegarem a ser julgados ou não se forem prescrevendo pelo caminho da conhecida morosidade judicial.
De qualquer modo, já se vê a briga silenciosa de foice entre o presidente Omar Aziz (PSD-AM), o vice-presidente Randolfe Rodrigues (Rede-AP) e o relator Renan Calheiros (MDB-AL) todos disputando a paternidade da CPI, ou seja, quem aparecerá mais no final dos trabalhos, mesmo sem melancia pendurada no pescoço.
O estúpido Renan Calheiros até havia engendrado uma festa-apoteose, inclusive com a presença de figuras globais, para encerrar a CPI. Foi convencido de que, com tantas mortes, a festa não cairia bem e até seria interpretada como uma afronta à memória dos falecidos, parentes e vítimas sequeladas da covid-19 e ainda vivas.
Se forem colocados alguns senadores da CPI e o presidente Bolsonaro na mesma balança, certamente eles se igualam, cada um a seu modo, em seu campo de atuação e em sua forma de agir.
Em resumo, entre alhos e bugalhos, a CPI deixará como legado a hipocrisia dos senadores, dentre idiotices e vaidades outras que abundam na comissão.
O que mais abunda na CPI é a abundância de idiotices.
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