Quem quiser confirmar esse caso pergunte ao jornalista Juca Kfouri, lulopetista de alto costado, impoluto homem de esquerda, senhor de grande respeito e que está aí vivíssimo da silva, graças a Deus.
Gosto muito dele.
Em 1969, Carlos Knapp, militante de esquerda, com a ajuda de amigos, inclusive de Juca Kfouri, fugiu da feroz ditadura militar e refugiou-se em Montevidéu, no Uruguai.
Às pressas, perseguido pela polícia da ditadura, que estava em seu encalço, embarcou disfarçado num fusca e deixou seu reluzente Mercedes Benz no aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro. Nunca mais viu o carro.
O delegado Sérgio Paranhos Fleury, ícone da repressão na época da ditadura militar, se apropriou do Mercedes de Carlos Knapp e o usou durante dez anos como se dele fosse, até morrer.
Fleury era o chefe do Departamento Estadual de Investigações Criminais (DEIC) de São Paulo e terror da esquerda militante, que lutava contra a ditadura dos generais.
Ou seja: o delegado Fleury cometeu crime de apropriação, assim como fazem magistrados de norte a sul do Brasil.
Só para lembrar aos mais jovens: Sérgio Fleury foi o delegado comandante da emboscada que matou o guerrilheiro comunista Carlos Marighella em 04 de novembro de 1969, na Alameda Casa Branca, em São Paulo.
Quando o leitor se deparar com juiz, desembargador ou ministro de tribunais superiores arrogante e grosseiro, comece a desconfiar. Ele é potencialmente corrupto.
O magistrado corrupto usa a arrogância e a tática do distanciamento para desviar-se do foco, qual seja, sua conduta repreensível e criminosa.
Magistrado decente, que se preza e respeita a nobre função de juiz, não menospreza advogados, réus, investigados, et cetera, por uma razão muito simples: o magistrado é a nobreza em si, a voz e o poder do Estado e, como tal, deve respeitar qualquer um, independentemente de ser ou não acusado. Aí está sua tão exigida imparcialidade. Aí está sua humildade.
É a lei que assim dá o parâmetro, nada mais do que a lei.
Há inúmeros casos de juízes, desembargadores e ministros de tribunais, que saem por aí atropelando a Constituição e decretando prisões atabalhoadamente, como se fosse o suprassumo da honestidade e o pedestal da intocabilidade.
Conheci um juiz em São Bernardo do Campo, em São Paulo, que certa vez me deixou esperando praticamente uma tarde inteira para colher seu despacho num processo cautelar e, portanto, urgente.
Simplesmente com o intuito de me deixar esperando. Não havia outra razão. Estava em seu gabinete, acompanhado de um auxiliar. Soube depois, que Sua Excelência se ocupava naquela tarde de fazer jogo da loteria esportiva durante o expediente.
Portanto, segundo a acanhada inteligência daquele juiz, dane-se o advogado e dane-se quem, naquele momento, dependia da Justiça. A urgência era apenas um detalhe.
Esse juiz foi condenado e preso, por extorsão. Ele extorquiu 177 vezes, no exercício da função de juiz. Cometeu 177 vezes o crime de extorsão. Pedia dinheiro para decidir a favor de quem lhe atulhava os bolsos.
Esse mesmo juiz, depois de preso, por muito tempo, ainda continuou a ganhar R$ 52 mil, a título de aposentadoria, paga pelo contribuinte, mas o Tribunal de Justiça de São Paulo, diante da aberração e pressão da sociedade, acabou destituindo-o do cargo de juiz.
De outra feita, um juiz de São Caetano do Sul, também em São Paulo, não me atendeu porque, apesar de estar de paletó, eu não usava gravata. O caso era de extrema urgência e não havia tempo de preocupar-me com gravata.
Quase fui preso por desacato. Protestei e disse que o direito do meu cliente não estava na gravata que eu deveria usar, mas na lei que eu estava invocando.
Não faz muito tempo, no Rio de Janeiro, um juiz que adorava holofotes, foi condenado à prisão, por apropriar-se de um Porsche do empresário Eike Batista.
O juiz havia apreendido o veículo de luxo em processo que deveria julgar, mas passou a usá-lo como se fosse dele.
Ficaria aqui, horas, citando casos de magistrados arrogantes e corruptos. Dá para compor uma triste e constrangedora enciclopédia.
Não vou cansar o leitor.
Qualquer semelhança com magistrados que estão por aí, diariamente diante dos holofotes e pisando na lei, é mera coincidência.
A sociedade precisa deixar de se apequenar e vigiar nossas autoridades, inclusive magistrados, que se acham intocáveis.
A lei vale para todos, inclusive para os magistrados.
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