O Poder Judiciário e a destruição da cidadania

A média dos brasileiros estava acostumada com dois princípios inquestionáveis que se sustentaram ao longo da existência humana: a onisciência de Deus e a infalibilidade do papa, que se arrasta desde o ano 90 da era cristã e se robusteceu na Idade Média.

Entretanto, alguns ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) estão tentando revogar esses dogmas, substituindo-os pela pequenez de suas arrogâncias.

Pelo que se vê, oniscientes são esses ministros – e não mais Deus – e falíveis são as deliberações do papa e infalíveis são as decisões que eles tomam. Não aceitam contrariedade jurídica, não acolhem opiniões contrárias conforme manda a natureza da Justiça.

Segundo esses nossos subidos e supremos ministros, as urnas eletrônicas são “infraudáveis”, de modo que não se pode discutir absolutamente nada que arranhem a suposta credibilidade que eles atribuem às urnas. Elevaram-nas ao patamar estapafúrdio de distorção da lógica.

Sequer se pode questioná-las sobre eventuais falhas técnicas sob pena de ser acusado de atentar contra as instituições democráticas, segundo o entendimento de, pelo menos, três ministros do STF/TSE, que se acham intocáveis.

E são intocáveis mesmo, por uma razão facilmente explicável: O Senado Federal que os sabatina e aprova para o STF está infestado de corruptos com processos em trâmite no STF que serão julgados por esses mesmos ministros que eles aprovaram em sabatina. Está aí a raiz da covardia dos senadores, do comodismo, da indiferença com relação à vontade da sociedade ou parte dela no sentido de, pelo menos, interpelar esses ministros “intocáveis”.

Sede do Supremo Tribunal Federal/Aqui ainda repousa a esperança dos brasileiros.

Há um episódio recente e vergonhoso para o Senado da República. Mais do que vergonhoso, humilhante. Alguns ministros do STF, convidados por senadores para discutirem assuntos de interesse nacional naquela Casa Legislativa, sequer deram resposta. Ou seja, deram de ombros ao convite dos mesmos senadores que os aprovaram em sabatina para o STF. Mais do que sinal de que se acham intocáveis, depreende-se uma declaração implícita de arrogância e desrespeito aos senadores e ao Senado da República e, por extensão, à sociedade.

O TSE elevou às urnas eletrônicas à condição de único sistema eletrônico do mundo que não é passível de fraude. Até os poderosos e sofisticados sistemas bancários mundiais são passíveis de fraudes, sujeitos à invasão de hackeres, mas as urnas não, segundo ministros do TSE.

Não se vislumbra absurdo maior do que este em nenhuma legislação do mundo moderno. Mas eles se dizem democratas.

Logo, o TSE extinguiu, por tabela, a função do advogado eleitoral, aquele profissional que cuida da defesa de candidatos que se sentem supostamente prejudicados com o resultado das eleições.

Se o resultado das urnas não pode ser questionado democraticamente, através das leis substantivas e processuais, então pra quê advogado? Qual a serventia e eficácia da atuação desse profissional junto à Justiça Eleitoral?

Sede do Tribunal Superior Eleitoral/ Monumento à arrogância

Nenhuma. Se a premissa é que está tudo certo, questionar o quê?

Entretanto, inconformar-se com resultados eleitorais adversos é exercício de cidadania, aliás amparado pelo nosso ordenamento jurídico nacional.

Pelo que se vê, doravante candidatos a governador e prefeito, por exemplo, não podem mais questionar resultados eleitorais sustentados em quaisquer fundamentos legais, mesmo que se sintam gritantemente prejudicados.


Segundo o TSE as urnas são infalíveis, invioláveis, inquestionáveis. Em quadro assim, a tecnologia substituiu o raciocínio, a inteligência, o bom senso, a lógica, a seriedade, a vergonha. Fere mortalmente a cidadania que está sendo corroída e liquidada.


Mais claro que isto, impossível.

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O absurdo chegou a tanto, que nenhum candidato pode mais questionar o resultado das eleições sob pena de ser acusado de crime contra as instituições nacionais. Mais do que isto, endeusaram um penduricalho eletrônico.


Ainda bem que esses setores do Poder Judiciário não aboliram a soberania do voto popular, embora estejam golpeando a cidadania: censuram redes sociais, prendem jornalistas e políticos, abrem inquéritos ao arrepio da lei, desrespeitam o Ministério Público, suprimem aparelho celular no local de votação, apequenam o direito dos cidadãos.


Pior: puniram até um advogado que ousou cumprir a lei em defesa de seu cliente e, por consequência, em desfavor de apadrinhados de alguns ministros do Judiciário.


Não é exagero vislumbrar que o próximo passo desse descalabro ditatorial do Judiciário poderá ser a censura à imprensa, aos livros, aos meios de comunicação, et cetera.


Aí já seria demais, mas não é razoável duvidar. O horizonte estratégico e reprovável deles é muito amplo, amplíssimo.


O intuito deles – grande parte da sociedade sabe – em nada beneficia os brasileiros, mas setores que eles defendem para se perpetuarem no topo dos privilégios e das mordomias pagas com dinheiro suado dos impostos que os brasileiros suportam.

Há muito tempo ainda para que presenciemos outros absurdos forjados na cabeça de algumas de nossas arrogantes autoridades do Poder Judiciário.

O TSE conseguiu transformar as eleições de 2022, maior festa democrática dos brasileiros, num evento tosco, eivado de medo, desconfianças, ameaças de prisão, absolutamente incompatível com a robustez da democracia.

O Brasil está pelo avesso e precisa tomar vergonha e convocar uma Assembleia Nacional Constituinte para ajustar essas anomalias, mas sem esses congressistas lambe-botas que estão aí se agachando diante de decisões de ministros do Judiciário que se acham donos do Brasil.

Só uma Assembleia Nacional Constituinte será capaz de evitar que autoridades mudem regras a seu bel prazer e passem a se colocar no lugar de servidores da sociedade e da República e não de beneficiários de si próprios.

Só uma Assembleia Nacional Constituinte será capaz de destruir o pedestal da arrogância e da pequenez dessas autoridades do Poder Judiciário.

Dentro da lei, conforme a lei. Sempre dentro da lei. Nunca fora da lei.

araujo-costa@uol.com.br

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