“Há tempo de amar e tempo de amar o que se amou” (Marques Rebelo, cronista e romancista fluminense, 1907-1973)

Guardo, com carinho, uma carta escrita de Petrolina (PE) em 21/12/1979. Como se vê, há aproximados 44 anos. Mantenho-a intacta, porque faz parte de minha história de vida, uma página das somas acrescentadas ao meu caminhar.
A carta – naquele tempo ainda se escreviam cartas – é de Claudemira Maria Teles do Nascimento, educadora de tradicional família de Riacho Seco, município de Curaçá.
Conhecemo-nos no simpático distrito de Riacho Seco, numa agradável tarde de 1975. Estávamos reunidos na única escola estadual do distrito naquele tempo, que certamente hoje adquiriu contornos físicos e culturais mais adiantados, em razão do progresso e dos presumíveis esforços de nossas autoridades.
“Descobri que pequeno e inútil é aquele que não sabe amar”, dizia a missivista em certo momento da carta longa, inteligente e saudosa. Eu já morava em São Paulo para onde os sonhos me tinham empurrado em busca de horizontes mais claros.
Certa vez, em passagem por São Paulo, no aeroporto de Congonhas, Dadá me presentou com o livro O Pilão, de Adolpho Bloch, talvez um estímulo para que eu continuasse perseguindo meus objetivos. Nunca deixei de pensar nisto.
Claudemira faleceu precocemente no auge de sua agitada e irrequieta atividade intelectual. O sepultamento se deu em 21/03/1982 no cemitério de Petrolina e coube-me dizer algumas palavras, entrecortado pela emoção e espezinhado pela crueldade da morte inesperada.
Dilacerado eu dizia: Você sempre liderava os grandes passos, as decisões difíceis. E quando os obstáculos cruzavam seu caminho, você se servia deles transformando-os em estímulo para o prosseguimento da caminhada.
Dizia também que amar é estar presente, “fisicamente quando possível, espiritualmente sempre”. Acho que garimpei essa frase de algum texto de Vinicius de Moraes.
A íntegra desse titubeante e despedaçado discurso está em meu livro Fragmentos do Cotidiano (São Paulo, 1987).
Claudemira era carinhosamente conhecida pelo apelido Dadá.
Outro dia, ajuntando pedaços de saudade, fiz um esforço de memória, de resto já esburacada pela passagem do tempo e me lembrei do núcleo familiar de Dadá, além da mãe e do pai: Creuza, Socorro, Maria Áurea, Risalva, Ivan, Bedeu, Cisinho, todos Teles, todos Nascimento, todos de índole irrepreensível. E ainda as queridas tias Glorinha e Lili, exemplos de vida e decência familiar.
Turma alegre, espirituosa, sincera, hospitaleira.
Mais tarde, a Rua Maurício Vanderley, no centro de Petrolina, era a referência da família, o aconchego, porta aberta às amizades. Lá se davam os encontros dos amigos, parentes e aderentes daquela ilustre família curaçaense de Riacho Seco.
Dadá fazia parte dessa família expansiva e feliz.
Hoje, faço este vazio resumo de lembranças no entardecer inarredável da vida, em razão do adiantado da idade de todos nós daquele tempo e daquela geração.
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