Lula da Silva, Bolsonaro e a faixa presidencial

“Nada está mais próximo da ingenuidade do que a malícia levada ao extremo” (San Tiago Dantas, jornalista, jurista e político de esquerda, 1911-1964)

Quem conhece Lula da Silva de perto sabe que ele é especialista em dizer lorotas e jogar para a plateia.

Lula sabia. A direção do PT sabia. Jornalistas bem informados sabiam. Políticos experientes sabiam.

O ex-presidente Bolsonaro não passaria a faixa presidencial a Lula. Não havia clima. Parte de nossa sociedade ainda não aprendeu a diferença entre inimigo pessoal e adversário político.  

Contudo, com o intuito de jogar para a plateia lulopetista e toda esquerda diurética que o apoiou, em toda oportunidade que teve, Lula criticou Bolsonaro por ter saído do Brasil. Continua criticando.

Em café da manhã com jornalistas, Lula disse: “A única coisa que eu não queria era que Bolsonaro me passasse a faixa” (G1, 12/01/2023).

Lorota. Lula queria receber a faixa de Bolsonaro para vê-lo sendo vaiado. O PT queria. Os amigos de Lula queriam. Os apoiadores de Lula queriam. A massa de manobra lulopetista queria.

A entrega da faixa ao presidente que entra pelo presidente que sai não é requisito obrigatório.

Há precedentes de presidentes que não passaram a faixa e não houve estardalhaço, porque não se trata de nenhuma transgressão ou quebra de protocolo, mas episódio comum, sem muita importância.

É uma formalidade dispensável. Serve para o presidente tirar fotos, publicar em revistas e jornais. Nada mais do que isto.

Tanto isto é sem muita importância que o cerimonial de Lula da Silva fez aquele exibicionismo inusual na rampa do Palácio do Planalto no dia da posse e o presidente recebeu a faixa das mãos de pessoas do povo.

Não é a faixa presidencial que empresta seriedade ao cargo de presidente da República, mas o caráter do ocupante. Ah, o caráter!

A foto oficial do presidente com a faixa não é feita no momento da posse, mas em ambiente adredemente preparado. Assim foi com todos os presidentes, assim continuará sendo.

Em 15/11/1894, o presidente Floriano Peixoto não transmitiu o cargo para Prudente de Moraes.

Prudente de Moraes foi o presidente que em seu governo (1894-1898) mandou dizimar Canudos, matou milhares de sertanejos da Bahia, exterminou o beato Antonio Conselheiro e a história o entronou como o vencedor da Guerra de Canudos.   

O general-presidente João Figueiredo, último do regime militar, não passou a faixa para Sarney e chegou a espinafrá-lo depois:

“Sempre foi um fraco, um carreirista. De puxa-saco passou a traidor. Por isso não passei a faixa presidencial para aquele pulha. Não cabia a ele assumir a Presidência” (Entrevista a IstoÉ, 1999).

No que tange a Lula da Silva e Bolsonaro, o fato é explicitado no livro O Tribunal – Como a Suprema Corte se uniu ante a ameaça autoritária, de autoria dos jornalistas Felipe Recondo e Luiz Weber (UOL, 22/11/2023).

Dias Toffoli, ministro do Supremo Tribunal Federal, ex-advogado do PT, ex-assessor do então todo poderoso petista José Dirceu e próximo de Lula, aconselhou Bolsonaro a deixar o País e não passar a faixa presidencial ao novo presidente.

O argumento do ministro Toffoli se revestiu de visível sensatez: o País estava dividido e Bolsonaro receberia vaias no evento de transmissão do cargo, o que era previsível e constrangedor para o ex-presidente.

País dividido, Lula venceu por uma diferença aproximada de 1,8% dos votos, mas o que vale é a vitória, não a porcentagem.

Como Bolsonaro sempre manteve boas relações com o ministro Toffoli, essa circunstância deve ter pesado na decisão de se ausentar do Brasil.

Lula sabia disto, mas não disse. O PT sabia disto, mas não disse.

Como se vê, nem tudo que Lula e o PT dizem deve ser levado a sério.

araujo-costa@uol.com.br

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