“Amigo é o que chega quando as outras pessoas estão indo embora” (Walter Winchell, jornalista americano, 1897-1972)

A vida – ou a passagem dela – é feita de pedaços, fragmentos tais que se somam e nos tornam completos, embora frágeis e efêmeros.
Os amigos que encontramos pelo caminho fazem parte dessa soma que nos completa. Terá sido uma soma inquestionável se cada parcela tiver a prova de que não somos medíocres diante deles.
É na juventude que fincamos os esteios do caminhar, vislumbramos os horizontes, perseguimos os sonhos e, sobretudo, começamos a amadurecer para enfrentar os tropeços e as quedas constantes, que são muitas e inevitáveis.
Creio que os amigos que perduram surgem, quase sempre, nessa fase da vida. São essenciais, indispensáveis, necessários. Em certas circunstâncias, preenchem o nosso vazio, diluem as angústias e seguram as fragilidades. Impedem a empáfia, apontam os rumos e aparam as arestas de nossa arrogância. Flexibilizam a inexperiência e ajudam a diminuir os efeitos de nossas ruínas.
Sou grato a Mauá, que me acolheu, deu-me o primeiro emprego em São Paulo e me preparou para enfrentar o desconhecido e muitas regras de convivência.
Nordestino, passei a viver na terra dos outros e, bem por isto, meu modo de ser e agir precisava de muitas adaptações e constantes ajustes.
Surgiram os primeiros amigos. Dentre poucos, Odilon Soares de Toledo e sua esposa Conceição Gonçalves de Toledo. Prestativos e generosos, estes amigos permitiram a minha presença entre eles por muito tempo e deram-me o apoio que eu tanto precisava longe do meu habitat, o sertão da Bahia.
A convivência com Odilon me permitiu aprender a pensar, a conjecturar, a refletir.
O convívio me foi fundamental para discernir o melhor caminho em busca de outros valores, sem transgredir o meu passado.
Conceição e Odilon casaram-se ainda jovens em 1971, ele por volta de 19 anos.
Passei a frequentar a residência do casal como se fora da família e colher a sabedoria de um lar sustentado na simplicidade, no respeito e na dignidade.
Em sadias reuniões em sua casa, ouviam-se Linda Batista, Aracy de Almeida, Chico Buarque, Lupicínio Rodrigues, Vinícius de Morais, Noel Rosa, Dorival Caymmi, Caetano Veloso etc.
Lia-se Pablo Neruda e discutiam-se as matérias do periódico Movimento e dos jornais O Pasquim e Opinião, que faziam parte da chamada imprensa alternativa tolerada pela ditadura militar.
O pai de Odilon me ensinou a dar nó em gravatas. Lembro o momento, guardo o ensinamento, prezo a lição de paciência e vontade de ensinar.
Parece um gesto insignificante dar nó em gravatas. É-o, para muitos. Neste caso, não.
Minha esburacada memória ainda me faz lembrar o delineamento daquele momento eufórico de aprendiz. Eu viria a fazê-lo incontáveis vezes até hoje, por força do exercício da profissão.
Já se vão, por aí, aproximadas cinco décadas dessa convivência.
Quando a memória me leva à ocasião em que fui acolhido por Odilon e Conceição, recordo a frase de Walter Winchell que encima esta crônica.
Não tenho visto Odilon, não tenho visto Conceição, não tenho visto seus filhos. Faço aqui o registro de meu desleixo e de minha indiferença, alguns dos meus defeitos, dentre muitos que tenho.
Hoje é o aniversário de Odilon.
Deixo parabéns e desejo-lhe êxito sempre e à sua distinta família.
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