
Cúmplices das madrugadas, a conversa comprida noite a dentro devia se restringir somente a um encontro entre amigos, dentre os muitos arrastados pela boemia, em décadas.
Mas a conversa esticada resvalou-se para um pedido, feito já ao alvorecer: ele queria que eu escrevesse a orelha de um livro, ainda no prelo, com o sugestivo título A estrada pedregosa.
Esquivei-me.
Disse-lhe que de estrada, pedras no caminho e tropeços entendo eu e muito bem, quiçá mais do que ele, porque o sofrimento garranchento da vida se fez presente em meu caminhar.
O sofrimento ainda insiste em se fazer presente, inobstante o meu viver continuamente chafurdando neste naufrágio que é a velhice, tentando passar por cima de seus escombros.
Meu amigo não desiste e pergunta: que tal, então, o posfácio?
Conversa vai, conversa vem, o fato é que chegamos a um acordo e escreverei a orelha do livro – ou o posfácio – falando de estradas espinhosas, poeiras, pedras no caminho, quedas e tropeços.
Desconfio que o livro não vai sair, nunca será lançado e, portanto, não haverá orelha, nem posfácio. Talvez uma ilusão etílica da madrugada.
Posso prestar um testemunho. Há algumas décadas – já vai longe no tempo – comecei a escrever um livro que intitulei Diálogo dos sinos – artigos, crônicas, observações.
É um apanhado de minha vida, sem nenhuma pretensão de registrar quaisquer resquícios ou viés biográficos.
Não consegui construir ao longo do tempo nenhuma importância, tampouco alguma coisa que possa interessar a qualquer pessoa, mesmo em instância póstuma, que espero demorar.
Sou um peregrino insignificante que costuma escrever baboseiras.
O lançamento de Diálogo dos sinos – artigos, crônicas, observações dar-se-ia em 2023. Não aconteceu, nem tem previsão de acontecer tão cedo. Mas estou a caminho, continuo a caminho.
Há horizontes. Sempre há horizontes.
Em 01/08/2022 até publiquei uma crônica noticiando-o. Ei-la a seguir:
araujo-costa@uol.com.br