Andava eu por uma rua um tanto deserta, cantando O canto da ema e lembrando do maranhense João do Vale e do paraibano Jackson do Pandeiro, intérprete de Forró em Limoeiro e outros clássicos da cultura do Nordeste.
Tenho mania de falar sozinho em qualquer lugar. Acho até reprovável e feio. Mas, neste caso, não falava, cantava.
Os defensores do “politicamente correto” dificultam nossa vida. Convém ficar cauteloso e, mais do que isto, esperto. Evita cair em qualquer esparrela.
Quando eu cantava a parte de O canto da ema que diz “vem morena, vem morena me beijar”, uma moça morena vinha em sentido contrário, equilibrando-se entre um perigo e outro da calçada e resolveu falar comigo.
Imaginei que tivesse caído nas malhas do “politicamente correto” e ela ia me acusar de atrevido, saliente e outras coisas mais, por causa do “vem morena, vem morena me beijar”.
Afinal, não fica bem a um velho septuagenário, feio e de cabelos brancos, sair andando por aí pedindo beijos de morena. Além de inconveniente, chega a ser ridículo e reprovável.
Mas não é o meu caso. Não me separo do meu semancol.
Hoje, no tempo do “politicamente correto”, até dizer bom dia para desconhecido chega a ser perigoso. Não se deve mais elogiar ninguém, mesmo conhecido. Daí pode surgir uma mal interpretação. Não é bom ser educado nos dias de hoje.
Todavia, a moça era muito educada e parou simplesmente para dizer: “Meu pai gostava muito desta música!”. E continuou o caminho dela e eu o meu.
Nada fiquei sabendo do pai dela, que presumo nordestino, nem me interessei saber.
O susto passou e fiquei aliviado.
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