
Em 26/01/2025 completam-se 39 anos da morte do padre Conceição, que faleceu durante os festejos de Senhor do Bonfim.
Para ser o semeador de que nos falam os evangelistas é preciso, dentre outros atributos, crer na imortalidade da alma.
Para “retemperar o ânimo dos que se dão por vencidos precocemente”, como dizia Raul Pompéia, é necessário, sobretudo, embevecer-se na fé.
E para prosseguir no caminho do sacerdócio, é seguramente imprescindível uma inflexível lealdade aos princípios de humildade inerentes à condição de apóstolo.
Neste tempo da festa de Senhor do Bonfim, católicos e povo de Chorrochó em geral também reverenciam a memória do padre Conceição.
Conheci o padre Ulisses Mônico Conceição no início de 1971, em Chorrochó, quando este escrevinhador era estudante do então Colégio Normal São José.
A tendência para a observação, própria dos jovens, sustentava a convicção de que se tratava de uma extraordinária figura humana. O tempo se encarregou de provar isto.
Os jovens daquele tempo tinham grande respeito pelo vigário do lugar, líder religioso devotado à família e aos princípios da igreja. Fomos assim educados, assim estruturamos nossa formação social.
A postura respeitosa do padre Conceição dava o parâmetro para que todos nós o entendêssemos como um líder de elevada envergadura moral e sólida dedicação à Igreja.
Lembro suas andanças, passos largos e seguros, pelas calçadas de Chorrochó.
Muito presente na vida da comunidade, padre Conceição era atencioso, solícito, contemporizador. Dono de uma memória prodigiosa e de uma apreensão fulminante, atendia a todos que o abordavam.
No trato com os adultos criava um ambiente seguro, como se um amparo à pequenez dos fracos. No contato com os jovens, transmitia-lhes uma auréola de esperança necessária à sede de absoluto da adolescência.
A experiência retratava-se nos cabelos homogeneamente brancos, tingidos pelo tempo.
Não é possível falar do padre Conceição sem associá-lo às tradições de Chorrochó. O sertão é, ainda, uma universidade de costumes.
Como dizia o intelectual sergipano Tobias Barreto, “as tradições são o passado que se faz presente e tem a virtude de se fazer futuro”.
Padre Conceição participou ativamente da história de Chorrochó e viveu essas tradições que ajudou a sedimentá-las.
Nas litanias e procissões que se realizavam, era o destaque, paramentos brancos, como uma flor de lírio. Recordo de sua adoração fervorosa ao Santíssimo Sacramento. Interpretava magistralmente a fé.
Nascido em 09.09.1914, em Conceição de Almeida, faleceu em 26.01.1986 em Chorrochó, torrão ao qual vinha se dedicando desde o meado da década de 1950, primeiro espontaneamente, depois na condição de vigário da Paróquia do Senhor do Bonfim de Chorrochó, que ajudou a ser realidade.
A Paróquia foi criada em 27.01.1985. O jesuíta paulista D. Aloysio José Leal Penna (1933-2012), à época bispo da diocese de Paulo Afonso, instituiu a Paróquia de Senhor do Bonfim de Chorrochó
Mais tarde, D. Aloysio foi arcebispo de Botucatu (SP).
A instituição da Paróquia se deu durante as comemorações do centenário da Igreja de Chorrochó, construída em 1885 por Antonio Conselheiro.
A data está no frontispício do majestoso tempo do sertão da Bahia, construção histórica sustentada na fé e deixada pelo beato Conselheiro. Resistiu ao implacável passar dos anos e às intempéries.
Padre Conceição vinha de caminho longamente trilhado. Professor do Colégio Padre Antonio Vieira, em Salvador, certamente lá deixou fincada a eloquência de seus ensinamentos. Eloquência que talvez tivesse origem no sermão que o próprio padre Vieira pregou em maio de 1640 na igreja de Nossa Senhora da Ajuda, quando os holandeses apertavam o cerco à cidade da Bahia.
As ações do padre Conceição e as palavras do padre Vieira guardam incrível semelhança: a intensidade da fé.
A opção pelo sertão sofrido foi uma de suas qualidades de pastor humilde. Ter-lhe-ia sido fácil ficar na cidade grande, onde a comodidade das estruturas de vida e trabalho seria mais favorável. Não o fez. Preferiu Chorrochó.
O beato Conselheiro foi fixar-se nas fraldas das serras contíguas ao Vaza-Barris, onde em 13.06.1893 fundou Belo Monte, hoje Canudos, para ali construir uma sociedade supostamente igualitária.
Chorrochó, como outras localidades do sertão, ergueu-se sobre o pedestal da fé e perdurou. Canudos foi destruído pela crueldade dos homens.
Padre Conceição sempre foi atento aos pequenos nadas de que se compõe a vida, um homem de personalidade marcante. Sucedeu-o na igreja de Chorrochó, outro religioso dinâmico, ativo e muito dedicado à obra de Cristo: padre Mariano Pietro Brentan, italiano trabalhador e dedicado às causas da igreja.
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