“Brasil de ontem e de amanhã! Dai-nos o de hoje, que nos falta.” (Ruy Barbosa, 1849-1923).
Há crítico literário, social, político, crítico de ideias e por aí vai. E há, amiúde, crítico das circunstâncias.
Talvez inclua-me na última categoria. Casualmente dou minhas derrapadas e o faço quando tropeço em estridentes injustiças, mormente praticadas por poderosos contra desamparados, miseráveis, famintos e os que não têm voz, dentre muitos.
Insurjo-me, outrossim, contra autoridades arrogantes que se elevam acima dos ombros dos demais à custa do dinheiro público. Mas estou cônscio de que, nessa altura da vida, não verei o Brasil que minha geração sonhou.
Amigo de longa data que sabe de minhas noites insones, telefonou alta madrugada. Falou alhos e bugalhos.
Mais do que isto, incluiu na conversa, referência a alguns de meus escritos que, segundo o notívago invasor de meu silencioso sossego, ele não concorda, nunca concordou, tampouco concordará nalgum dia.
Concordando ou não, argumentei que ninguém pode se achar imexível, principalmente quem vive lambuzado no dinheiro público decorrente dos impostos que todos pagamos, inclusive os miseráveis.
Terminamos a conversa, já ao amanhecer. Ambos concordamos num ponto: o Brasil está passando por uma fase difícil e vergonhosa, porquanto estão mutilando seus pilares democráticos.
Sub-repticiamente estamos sendo censurados, vigiados e, em consequência, tolhidos no direito de expressão e de liberdade de pensamento e, sobretudo, diminuídos na condição de cidadãos.
“O Supremo Tribunal Federal (STF) anunciou a abertura de uma licitação para contratar uma empresa que será encarregada de monitorar as redes sociais sobre conteúdos que envolvam a Corte.
O Supremo quer saber tudo que se fala sobre ele nas redes sociais. A empresa que vencer a licitação fará um acompanhamento ininterrupto do Facebook, Twitter, Youtube, Instagram, Flickr, TikTok e Linkedin” (Veja, 16/06/2024, CNN Brasil, 17/06/2024).
O valor do dinheiro público torrado pelo STF para bisbilhotar os brasileiros beira R$ 345 mil por um ano.
“Segundo o edital, publicado em 14 de junho, o valor máximo para contratar o serviço é de R$ 344.997,60” (CNN Brasil, 17/06/2024).
Isto tem outro nome: prática ditatorial.
O ataque à cidadania está sendo feito às escuras, em nome da democracia. Aí está o perigo que redunda na degenerescência de nossas instituições, outrora vistas como sérias e respeitáveis e hoje não mais, porque questionáveis.
No período da ditadura militar (1964-1985), os brasileiros eram vigiados pelo temido Serviço Nacional de Informações (SNI) e os que mandam no Brasil de agora criticavam.
Hoje, basta o entendimento arrevesado de um tribunal ou de um magistrado afoito e destrambelhado para que a privacidade dos cidadãos seja invadida ao arrepio da Constituição Federal.
O Frade dominicano Carlos Alberto Libânio Christo (Frei Betto) diz, apropriadamente: “Quem tem pescoço sabe que a diferença entre a corda e a gravata está nas mãos de quem ata.”
Estamos diante do dilema da corda e a gravata em que a feitura do nó cabe aos imexíveis de nossa combalida República.
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