Só a sepultura é perpétua

“O homem é um ser entre o nada e o túmulo.” (Frase do padre português Pedro Gomes de Carmargo nos funerais do também padre Diogo Antonio Feijó)

Em idade septuagenária, não sei se chegarei muito adiante neste caminhar em direção às incertezas do desconhecido.

O caminho já se apresenta espinhoso, pedregoso, cheio de obstáculos. O caminhante um tanto trôpego, embora sustentado na fé e consciente das dificuldades para o prosseguimento da caminhada.

Uma de minhas filhas, em conversa sobre assuntos profissionais, me fez a seguinte pergunta, de supetão, em cima da bucha, exigente, quase pedindo explicação:

– Pai, e se o senhor morrer?…

Excluídas as reticências, por óbvio, enumerou uma série de consequências de minha morte, mudando  do  “se” para o “quando” – o que é mais certo – porque não se trata de uma questão condicional e evitável, mas inarredável de tempo e espaço.

Ciente da efemeridade da vida, aí me “caiu a ficha”.

É sinal que a família está preocupada com minha senilidade, o que faz muito bem. Ou já está me achando com um pé na beira da cova, prestes a escorregar túmulo abaixo.

Quiçá seja o desabrochar do etarismo, que conhecíamos na juventude como idadismo e  a geração de hoje seriamente detesta e se incompatibiliza.

Diz o escritor amazonense Mílton Hatoum que “a velhice pode ser um naufrágio”.

Se for assim – e se é assim – há tempo estou naufragando nas correntes caudalosas e perigosas das águas da vida, em direção ao estuário da finitude.

Então, deve ser tempo de alinhavar e engendrar as linhas do funeral, que não sei se está perto ou longe, mas será razoável que ninguém chore no dia da partida, embora todos tenhamos a liberdade de chorar (ou não).

Não compensará a tristeza, não valerá a pena o desalinho desse passar tão desimportante, porque “o homem é um ser entre o nada e o túmulo”.  

Sou efêmero e só a sepultura é perpétua.

Acho que é hora de acordar para refletir, já que todo esse tempo passado não fiz outra coisa senão sonhar.

araujo-costa@uol.com.br

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