Patamuté, tempo e memória de Nicolau Cordeiro

Nicolau Cordeiro/Arquivo de Antonio de Nicolau Cordeiro

Quero registrar, logo assim, de saída, que sou de uma geração que costuma revisitar lembranças, com o intuito de reviver, sedimentar gratidão e registrar saudade.

Se não olharmos no retrovisor do passado, temos dificuldades de compreender o presente  e construir os alicerces para sustentar o futuro.

Conheci Nicolau Cordeiro da Silva na década de 1960, em Patamuté. Já se vão, por aí, mais de seis décadas. Convivemos por algum tempo, dividíamos dissabores, preocupações e alegrias.

Prestativo, educado, generoso, conversa agradável, preocupado com as deficiências do lugar, sobretudo preocupava-se com a educação da infância e da juventude. Homem de visão, inobstante as limitações de Patamuté.

Nicolau Cordeiro foi um bom amigo que tive na vida. Como esquecê-lo! Ele fez a façanha de viabilizar minha condição de professor particular em Patamuté, mas esta é outra história um tanto longa que demanda muitas considerações.

Nicolau conversou com os pais dos alunos, indicou a necessidade de complementar o estudo dos jovens, angariou condições, justificou minha escolha e, mais do que isto, não deixou se escapulirem as oportunidades de manter aquele sonho em benefício da juventude da época.

Andam, por aí, ainda, cavando a vida, alguns de meus ex-alunos. Outros já se foram. Era difícil separar a amizade do ofício de professor, de modo que éramos todos amigos. Não existia nenhuma diferença ou distância aluno-professor.

Em Patamuté, naquela quadra do tempo, havia somente o Prédio Escolar (Escola Estadual), na saída para o Paredão, onde ensinavam as professoras da educação primária, formalmente habilitadas para o ensino regular.

Pela Escola Estadual de Patamuté passaram respeitáveis professoras que ajudaram a construir a história do lugar, a exemplo de Maria Vilani Brandão Leite, Ana Mendes Vital Matos, Adalzira de Souza Alcântara, Beatriz Gonçalves dos Reis Gomes, Cremilda Gomes de Sá, Maria Mendes Callo (Nazinha), et cetera.

Nicolau viabilizou um espaço para acolhimento de meus alunos. O local situava-se vizinho às casas do Major Otaviano Matos (depois reformada), Lídio Manoel dos Santos e José de Souza Alcântara (Zé Lulu), mesma rua do antigo Posto Policial, que ficava na esquina.

Rua de Patamuté/Foto sem data/Reprodução facebook

Na ocasião, no mesmo local, tinha um serviço de alto falante que funcionava somente à noite. Tocavam-se músicas da Jovem Guarda, movimento que estava no auge.

A luz de Patamuté dependia de um motor (gerador) e apagava-se às 22 h, quando muitos se recolhiam e outros ficavam sentados em cadeiras nas calçadas, conversando. Nesse ambiente nasceram muitas amizades em Patamuté.

Eu frequentava a calçada de Eliziaria Moreira e de seu esposo José Henrique de Souza (Zeca Babau), respeitado Oficial do Cartório de Registro Civil. As conversas iam até muito tarde, despretensiosas e agradáveis.

Nicolau Cordeiro morava na Rua dos Ferreiras numa casa aconchegante. Lembro que cultivava parreiras. As uvas eram viçosas, bem cuidadas, bonitas.

Hoje a Rua dos Ferreiras cresceu, está mais movimentada, com mais casas, mais moradores e adaptada à passagem do tempo.

Uma rua nascida da tradição do povo, ao redor da casa dos “Chias”, sem alcunha oficial atribuída pelo poder público. “Os Chias”, segundo relatos históricos, foram habitantes de Patamuté nos primórdios do lugar.

Rua pequena, limitando-se com as pedras disformes do bonito mármore de Patamuté sobre as quais pastavam animais.

Nicolau compatibilizava sua luta diária e o cuidado com a família que soube estruturá-la muito bem, educadamente.

Nicolau e eu somávamos sonhos com o intuito de vislumbrar horizontes mais promissores para aquela geração de Patamuté.

Fracassamos, em parte. Patamuté, hoje, é o resultado de sucessivos descasos que depõem contra nossos governantes e representantes na Câmara Municipal.   

Amigo que perdurou, in memoriam.

Quando é assim – e assim o é – difícil a amizade se esvair no tempo. Ficam as marcas, os esteios indestrutíveis da gratidão.

Observação:

Matéria originalmente publicada em 19/08/2025 e editada em 20/08/2025 para acrescentar foto de Nicolau Cordeiro, generosamente enviada pelo filho Antonio. O blog agradece a atenção.

araujo-costa@uol.com.br  

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