Sim, somos imbecis

“A internet deu voz aos imbecis. Hoje, todo mundo é especialista. A pessoa bota terno, gravata, coloca painel falso de livros atrás e começa a falar desde a guerra da Ucrânia até o preço da gasolina, passando pelo Judiciário e acaba sempre atacando o Supremo” (ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal).

Portanto, claríssimo está como Sua Excelência considera e trata os brasileiros, o que, de resto, não é apropriado para um ministro do Supremo Tribunal Federal. Declaração incompatível com o cargo, com a liturgia do cargo, com a nobreza da toga.

A imprensa noticiou, ad nauseam, essa declaração do ministro Alexandre de Moraes, no Congresso Brasileiros de Magistrados, na Bahia, no último mês de maio.

Somos imbecis, sim, senhor ministro.

Pelo menos 152 milhões de brasileiros usam a internet, 81% da população acima de 10 anos, segundo a Agência Brasil, órgão vinculado ao governo de nossa cambaleante República.

Certamente esses milhões de brasileiro têm voz, não necessariamente em razão da internet, mas porque vivemos num país democrático e, como tais, amparados pela Constituição Federal que assegura a todos o direito de expressão e livre manifestação do pensamento.

“Pesquisa promovida pelo Comitê Gestor da Internet do Brasil revelou que, em 2020, o país chegou a 152 milhões de usuários – um aumento de 7% em relação a 2019. Com isso, 81% da população com mais de 10 anos têm internet em casa”, consoante a Agência Brasil. 

Nosso inalcançável e subido ministro do STF fez até, não sei se involuntariamente, propaganda da GloboNews, penduricalho do Grupo Globo, que o apoia cegamente. Citou-a em sua fala espalhafatosa.

Então, o desembargador da Região Norte e, portanto, membro do Poder Judiciário, que em audiência virtual, deixou cair o painel posicionado às suas costas, simulando uma estante, seria imbecil?  

Uso terno e gravata diariamente, por força da profissão que exerço, mas confesso que não me acho imbecil, como presume o ministro, que jogou todos os brasileiros que usam internet na mesma vala.

E se, eventualmente, eu gravar algum vídeo ou me permitir aparecer em foto, tendo ao fundo uma estante com livros, esclareço ao ministro tagarela que a estante é verdadeira. Tenho livros, sim. Muitos livros.

Avesso à liberdade de expressão que diz defendê-la, é indubitável que a arrogância e a vaidade subiram à cabeça de Sua Excelência.

Um país que indica e nomeia ministro de sua Suprema Corte simplesmente por ser amigo do presidente da República de plantão ou amigo de seus amigos e não em razão dos conhecimentos jurídicos do indicado, está fadado a conviver com embaraços como esse.

Vê-se alguns ministros da Suprema Corte pendurados em redes sociais dando palpites, inclusive sobre assuntos que vão julgar. Um disparate.

Está aí, como exemplo, a recente reunião de empresários brasileiros –  partes em processos judiciais em tramitação – e magistrados brasileiros, em Algarve, Portugal, evento financiado pelos mesmos empresários que eventualmente serão julgados por esses mesmos magistrados. Uma imoralidade.

Mas, inobstante discordar do destempero inoportuno de Sua Excelência, admito que somos imbecis, sim, senhor ministro.

Sua Excelência tem razão. Está coberto de razão. Assiste-lhe razão.

Um país que eleva qualquer diletante vaidoso e militante político à condição de ministro de sua Suprema Corte só pode estar infestado de imbecis.

araujo-costa@uol.com.br

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