A piada não tem graça, Excelência.

Ministro João Otávio de Noronha/Crédito: STJ

“Dizem que o baiano é tão ágil, tão ágil, que quando joga basquete, ele arremessa a bola na sexta e ela só cai no sábado.” (ministro João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, G1 Bahia, 20/03/2025).

A imprensa publicou, exaustivamente, este disparate do magistrado, desnecessário, nonsense, inoportuno.

O ministro do STJ, em sessão no Tribunal, fez chacota dos baianos, chamando-nos indiretamente de indolentes.

Sua Excelência deveria se dedicar ao seu mister de magistrado e não, em vez de trabalhar, ficar fazendo piada sem graça.

O governador petista Jerônimo Rodrigues, acertadamente, saiu em defesa dos baianos e pediu respeito.

“Sempre defenderei meu estado e não aceitarei que tentem reduzir a Bahia a uma visão superficial e distorcida. Nosso povo é inteligente, trabalhador, competente e dedicado. Não vamos normalizar esse tipo de discurso. Respeite a Bahia.”, disse o governador dos baianos (G1 Bahia, 20/03/2025).

O governador está certo. Certíssimo.

A Bahia deveria declarar o ministro persona non grata. Sua opinião sobre os baianos é dispensável.

Como se não bastasse nossos problemas internos na Bahia – que são muitos – ainda esta inoportuna  piada sem graça.  

Os baianos não são preguiçosos e nem acomodados.

Ao contrário, temos tradição de luta e trabalhamos muito para sustentar os privilégios e as mordomias, inclusive do ministro piadista. 

Palavreado inadequado, mormente vindo de ministro do STJ, ex-presidente do Tribunal e ex-Corregedor Geral do Conselho Nacional de Justiça.   

A nobreza das dependências do Tribunal não pode ser transformada em bate papo de botequim.

Entrementes, até nos botequins, as conversas devem ser respeitosas, para não ofuscar a urbanidade que todos devemos cultivar relativamente aos demais.

O poder, qualquer que seja a esfera, não pode estar acima do respeito, da boa educação e, sobretudo, da razoabilidade.

O presidente Jânio Quadros, estadista inquestionavelmente ético, no dia da renúncia, em 25/08/1961, escreveu:

“Há muitas maneiras de servir à Pátria”.

E certamente – acrescento eu – não é fazendo piada sem graça de baiano. É trabalhando, sobretudo.  

Vá trabalhar, ministro.

Vossa Excelência é pago pelos brasileiros, inclusive pelos baianos, para trabalhar e não para fazer humor sem graça.

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Curaçá, a arte e o mistério.

“O artista é criador de coisas belas. Revelar a arte e encobrir o artista é a razão de ser da arte.” (Oscar Wilde, dramaturgo e escritor irlandês, 1854-1900)

Quadro de autoria de Kekê de Bela

Devo pedir vênia ao artista Kekê de Bela para reproduzir – e reproduzo aqui, vistosamente belo – o quadro de Domingos Rodrigues dos Santos.

Retirei-o da página do insigne pedagogo e poeta Demis Santana no facebook, a quem também peço escusas pela bisbilhotice.

Conheci Domingos em meu tempo de Curaçá, bela cidade baiana debruçada à margem do São Francisco. Criatura essencialmente pura, humilde e, sobretudo, desprovida de maldade.

Garimpei sucinto texto deste escrevinhador sobre Domingos. O professor e jornalista Luciano Lugori generosamente o transcreveu no Blog do Luciano Lugori em bonita página de 13/07/2013 e, anos mais tarde, o fez, igualmente, no livro de sua autoria Enquanto Enlouqueço.

Ei-lo:

Domingos fez parte daquelas criaturas que nos permite refletir, circunstância tão incomum no mundo de hoje. Impossível esquecer seu jeito sorrateiro, seu sorriso-gargalhada, sua mão estendida. Todavia, o que traz a reflexão era seu olhar humilde, quase uma súplica. E sua condição de indefeso diante de nossas arrogâncias. Em qualquer ambiente chegava acanhado, tímido, como se pedindo permissão para entrar. Se, como dizem, os olhos são a janela da alma, vi isto muito nítido na humildade do olhar de Domingos

Aliás, Luciano Lugori escolheu Domingos como um dos perfis que enriqueceram o monumental Enquanto Enlouqueço. Lá, o autor diz que Domingos “foi um dos doidos mais estimados pelo povo de Curaçá”, o que parece ser o entendimento de muitos de nós curaçaenses.

O mistério fica por conta do desaparecimento de Domingos em 20/11/2002, num contexto dificil de explicar, mas nem tudo é explicável diante de nossa diminuta capacidade de entender as coisas.

A primorosa e admirável arte de Kekê de Bela revela sua grandeza de artista que embeleza e enriquece a vida e a História de Curaçá e da região sanfranciscana.

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Os desvios do Poder Judiciário

A arrogância de alguns magistrados de nosso Poder Judiciário está-se desmilinguindo.

Quem sabe, isto sirva de exemplo para que membros de nossa nobre e subida Justiça aprendam a descer ao pé da escada e se tornem mais humildes, coisa difícil de ver em varas e tribunais deste altaneiro Brasil.

Sou do tempo em que se levantava e tirava o chapéu, em sinal de respeito e reverência, quando o Juiz da comarca adentrava o ambiente comum de todos.  

Hoje, magistrados andam cercados de seguranças para não serem agredidos verbalmente ou xingados. Há exceções, por óbvio.

Houve uma decadência estúpida da moralidade e, em consequência, a mudança de conduta da sociedade fez-se evidente, imprópria e inadequada, o que não é bom.        

Os escândalos envolvendo magistrados estão sendo constantes, amiúde, vergonhosos, inaceitáveis.

O que anima a esperança é que ainda há magistrados sérios, certamente a maioria.

Esses escândalos vão desde privilégios de magistrados que ganham salários exorbitantes beirando R$ 1 milhão de reais, acrescidos de mordomias e penduricalhos outros e, ainda, a prática de vendas de sentenças, formação de organização criminosa, et cetera.

Tudo que não pode frequentar ou arranhar a moralidade da magistratura.

Só para citar uns poucos exemplos, aliás pouquíssimos, diante do cipoal de escândalos e desvios morais:

A Polícia Federal está investigando gabinetes de ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Ditos gabinetes são investigados por venda de sentença em troca de valores milionários.

A venda de sentença é uma prática espúria e criminosa em que o magistrado recebe dinheiro da parte interessada no processo para exarar decisão a seu favor e em prejuízo da parte adversa.

O STJ é conhecido como o tribunal da cidadania. Por isto, custa acreditar que ministros estejam envolvidos nisto.

Em data recente, três desembargadores do Rio de Janeiro foram condenados à prisão. “Eles foram considerados culpados por crimes como associação criminosa, peculato, corrupção passiva e ativa e lavagem de dinheiro.” (EBC/Agência Brasil, 14/03/2025).  

A Bahia tem-se deparado com situações embaraçosas em que membros do Tribunal de Justiça se envolveram com falcatruas. Houve até expedição de decretos de prisão em desfavor de alguns deles.

“A Polícia Federal apurou esquema ilegal de venda e compra de decisões judiciais no Tribunal de Justiça de São Paulo. Um desembargador “foi responsabilizado por corrupção passiva, lavagem de dinheiro, associação criminosa, advocacia administrativa e violação de sigilo.” (G1 São Paulo, 31/10/2024).

Somam-se a esses poucos dos muitos exemplos, o paulatino descrédito em que vem caindo o Supremo Tribunal Federal, em razão de decisões estapafúrdias e desconformes a legislação.

Os exemplos são abundantes, estridentes, inegáveis.

O inquérito das Fake News (notícias falsas) aberto pelo STF, desconforme a legislação penal, completou seis anos em 14/03/2025, ao arrepio da lei.

Nos termos do artigo 10, do Código de Processo Penal, o prazo do inquérito policial é de 10 dias se o investigado estiver preso em flagrante ou preventivamente e de 30 dias se estiver solto. 

Este prazo de 30 dias pode ser prorrogado por prazos superiores, como 60, 90 ou 120 dias. 

Entretanto, o inquérito das Fake News está lá no STF, ilegalmente tramitando, há mais de seis anos e sem previsão de encerrar.

É neste andar da ilegalidade, que o Estado de Direito vem sendo arranhado, vilipendiado, espezinhado.

Deus tenha piedade de todos nós brasileiros.

Com o Poder Judiciário nesse nível de incongruências, a quem recorrer quando se necessita de Justiça?

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Em Curaçá, a relevância do jornal Asa Branca

“No jornalismo, o que importa é o resultado, não as dificuldades para obtê-lo.” (Jornalista Zuenir Ventura)

Capa do Jornal Asa Branca, de Curaçá (BA), outubro de 1980

Em outubro de 1980, o hoje desaparecido jornal Asa Branca, de Curaçá, município baiano debruçado à margem do São Francisco, publicou um artigo do sociólogo Esmeraldo Lopes intitulado Seca e Miséria.

Nascido na trilha da redemocratização do País, que saía da ditadura militar, o jornal Asa Branca resultou de louvável iniciativa de alguns abnegados curaçaenses, antes à margem das decisões políticas, dentre estes Omar Dias Torres (Babá) e Salvador Lopes Gonsalves que contaram com colaboradores do porte de Antonieta Galdieri e tantos outros. Coelhão, sobejamente conhecido em sua arte, cuidava da capa e diagramação do periódico.  

Quaisquer assuntos relativamente ao Nordeste são recorrentes e atualíssimos.

Esmeraldo Lopes discorreu desde a seca de 1870, quando morrreram “só no Ceará mais ou menos cem mil pessoas de fome”, até o êxodo de nordestinos para São Paulo e Amazônia à procura de meios de sobrevivência.

O trecho do artigo a seguir é atualíssimo, não obstante a demagogia dos governos que, também, continua igual, sem precisar de nenhuma atualização.

Dizia o mestre Esmeraldo Lopes, à época ainda morando em São Paulo :

“A partir de 1960, os trabalhadores vindos do nordeste, a maioria expulsos de suas posses de terra pelo coronéis e grileiros, passaram a encontrar mais dificuldades para arranjar meios de vida, muitos acabando por se entregar ao crime, à prostituição, sujeitando-se a morrer em favelas, quando ficavam perambulando pelas ruas arrudiados pelos filhos e esposas, dormindo pelas calçadas, vivendo de esmolas e perseguidos pela polícia.” (Jornal Asa Branca, Curaçá-BA, 31/10/1980).

O artigo é extenso. O sociólogo cita o escritor Alcindo Teixeira Mendes: “Sem grande exagero, poder-se-ia dizer que em cada quilômetro de estrada de seringueira na Amazônia, há uma cruz de nordestino”.

Como se vê, não se deve menosprezar a incapacidade de nossos governantes. Neste particular, são irrepreensíveis.

De 1980 – ano do artigo citado – até os dias de hoje, mais de quatro décadas, seguiram-se governos inócuos, inoperantes, negligentes, demagogos.  

Os exemplos são abundantes, inegáveis, tristes.

Quiçá o êxodo dos nordestinos em direção a outros estados, mormente em direção à Região Sudeste tenha diminuído, mas é razoável presumir que a situação de muitos deles, já fora de sua terra natal, continua de mal a pior.

Em São Bernardo do Campo, berço político do presidente Lula da Silva, multiplicam-se nas ruas e nas praças públicas, pedintes, desempregados, subempregados cavando a sobrevivência e, sobretudo, moradores de rua, que os governos de esquerda encontraram um termo bonito para defini-los: “pessoas em situação de rua”.

Nas visitas que faz a São Bernardo do Campo, nunca vi o morubixaba Lula da Silva observando, in loco, a situação dessas pessoas em situação de miséria.  

Contudo, é seguramente certo que Sua Excelência se deleita em suas ricas e diversas residências inalcançáveis para nós, mortais comuns.  

A mudança do conceito ou da definição dos moradores de rua não exclui a condição de miserabilidade dessas pessoas.   

Inclusos neste índice de miseráveis, certamente estão aqueles que o PT e Lula da Silva dizem, acintosamnte, que tiraram da pobreza.

Admiradores, fanáticos e súditos de Lula acreditam nesta monumental demagogia. Pior: inundam as redes sociais de asneiras e o defendem com unhas e dentes.

De qualquer forma, em se falando do Nordeste, os assuntos são sempre atuais, assustadoramente atuais, mesmo que nordestinos tenham passado a morar noutros estados.

O cerne da questão é sempre o mesmo: a incapacidade e ausência de vontade política dos governos de cuidarem de seus governados, seja comandado por Lula da Silva ou outro qualquer.

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Geraldo Menezes e a paixão pela música

Nascido Geraldo José de Menezes, hoje é mais conhecido pelo sugestivo nome de Geraldo Paixão, de Chorrochó.

Geraldo Paixão/Arquivo da família

Creio que adotou Paixão para firmar-se no meio artístico e, sobretudo, no que mais gosta de fazer: compor e cantar.

A mãe Maria Menezes (Pina) e o pai Francisco Arnóbio de Menezes, ambos de família tradicional de Chorrochó, deixaram prole numerosa e decente sustentada nas tradições locais.

A família de Pina e Arnóbio cresceu e hoje está ornamentada com descendência bem estruturada, alguns já famosos e, sobretudo, carrega sabedoria, honra e resepeito ao nome familiar.   

Jovem ainda, Geraldo Menezes optou pela arte. Canta e compõe canções desde a juventude.

Não consigo esquecê-lo na juventude em Chorrochó, década de 1970, jovem bonito e elegante de cabelos longos, sonhador e inteligente, cantando sucessos no então famoso Bar Potiguar, que iam de Quem mandou você errar, de Claudia Barroso a Detalhes, de Roberto Carlos.  

Geraldo andou por São Paulo, viveu no meio artístico e por lá vislumbrou a carreira de cantor, sem contudo abdicar de suas raízes interioranas chorrochoenses e, mais do que isto, nunca se tenha esmorecido quando enfrentou os tropeços naturais tão comuns na vida de artista. 

Tempos difíceis, que acompanhei na condição de amigo e admirador de Geraldo Menezes.

As noites insones, a procura de gravadora que lhe desse oportunidade, a possibilidade consequente de um contrato, a concorrência com cantores famosos, o mundo desconhecido e cruel dos shows, empresários, programas de televisão e a janela em direção ao sucesso tão sonhado e sempre distante e difícil.

Perseverante e persistente, Geraldo Paixão sempre trouxe consigo a força em defesa do que luta e acredita: compor, cantar, viver e sonhar.

Não parece inoportuno lembrar que o pai Francisco Arnóbio de Menezes e o tio Vivaldo Cardoso de Menezes eram músicos, embora não se dedicassem a este mister, por força da profissão que exerciam.

Profissionais de sucesso, em suas respectivas áreas de atuação, Arnóbio e Vivaldo herdaram dos antepassados esse pendor pela arte, mormente pela música instrumental.  

Recordo-me, com saudade, Arnóbio declamando e cantando músicas de Vicente Celestino com tal perfeição que O ébrio parecia mais uma invenção sua do que do verdadeiro intérprete.     

A título de exemplo, lembro que a história registra que Francisco Arnóbio Cardoso Varjão, que fazia parte da raiz familiar de Francisco Arnóbio de Menezes, era maestro e poeta. 

Há alguns anos – vai longe no tempo – estive em Chorrochó por ocasião da festa do padroeiro Senhor do Bonfim. Encontrei Geraldo Paixão numa daquelas barracas expostas na praça em frente à igreja.

Geraldo me presenteou com um CD e, mais do que isto, o autografou.  Guardo-o até hoje, com carinho e consideração. Lá está “A raposa e as uvas”, de Reginaldo Rossi, um de seus cantores preferidos.

Relapso, não costumo fazer contato regular com amigos, o que não exclui minha consideração.

Com o intuito de publicar esta matéria, à época fiz contato com Geraldo Paixão. Queria uma fotografia do nosso tempo de jovens, em Chorrochó, ele de cabelos longos, próprio da juventude rebelde da época.

Modesto e educado, Geraldo disse que não tinha fotos daquela época. Sei que ele tem, mas se preservou, evitou a lembrança de um tempo que não se pode mais explicar ao frio e conturbado mundo de hoje.

Estas são lembranças que a memória traz em meio aos tropeços do dia a dia. Chegamos à idade septuagenária. Eu, um pouco à frente de Geraldo, trôpego em direção à continuidade do tempo. Ele nascido em fevereiro de 1955. 

Com a idade chegam as lembranças e a certeza da finitude do caminho. Mas, como diz o dominicano Frei Betto: “É preciso guardar o pessimismo para dias melhores”.

Hoje faço este registro em nome da amizade e da incerteza da vida.

Em tempo:

Publicada pela primeira vez em 18/12/2021, esta crônica foi editada.

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Política, crítica e satisfação aos leitores

“Do rio que tudo arrasta se diz violento, mas não se dizem violentas as margens que o oprimem.” (Bertolt Brecht, dramaturgo alemão, 1898-1956).

De quando em vez sou questionado por leitores deste blog – poucos, felizmente – em razão de minhas críticas a ações de governos de esquerda o que, segundo esses leitores, significa viés político.

Não é. Confesso. Não há viés político.

Entendo que para apontar erros na gestão pública, qualquer que seja ela e fazer críticas a ações governamentais, o cidadão não precisa escudar-se num ou noutro lado político, de esquerda, direita, de centro ou qualquer outro.  

Fazer oposição é uma coisa, criticar erros é outra, completamente diferente.

O crítico não precisa ter neutralidade, necessariamente, mas deve amparar-se no dever de dizer a verdade e penitenciar-se diante das incompreensões.

Neste particular, esclareço. Não sou filiado a nenhum partido político e tenho votado de acordo com os ditames de minha consciência, de modo que faço comentários tão-somente sobre aquilo que os governantes, que têm o dever de fazer as coisas certas, geralmente não as fazem, consoante meu ponto de vista.  

Convenhamos, gestões públicas capengas e titubeantes não são problemas deste escrevinhador, tampouco dos leitores.

Contudo, tenho dificuldade de entender pessoas que apóiam este ou aquele líder político municipal, estadual ou federal e descambam para o fanatismo, abandonam o bom senso e desprezam a sensatez.

A cegueira ideológica que impede a argumentação sadia diminui o crítico, lhe tolhe a razão, apequena-o diante da sociedade.

O fato é que, na condição de cidadão – e considerando o plano federal – não consigo me calar diante de um Executivo negligente, um Legislativo inoperante e um Judiciário opressor.

O pensamento de Bertolt Brecht por si só é explicativo. Reclamar das críticas pressupõe entender a razão delas.

Neste sentido, não se afigura estranha a conhecida e lapidar frase do crítico Léo Gilson Ribeiro: “Quem luta para não ser oprimido pode se tornar opressor”.

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Briga interna no PT dificulta governo de Lula da Silva

Senador Jaques Wagner (PT-BA). Crédito: Senado Federal

“A tesouraria do PT é tida como o grande pano de fundo da crise que tomou a eleição interna. É ali que se faz a gestão do fundo eleitoral e do fundo partidário. O que confere ao ocupante da vaga um enorme poder de influenciar a gestão da sigla” (CNN Brasil, 11/03/2025).

Noutras palavras, é a Secretaria de Finanças do partido que está sendo disputada internamente no PT, rachou as correntes do partido e vem dificultando o governo do morubixaba Lula da Silva.

Ou seja, todos querem a cobiçada função de Tesoureiro. Na Tesouraria foram forjadas – ou passaram por lá – partes dos grandes escândalos financeiros dos governos petistas que desaguaram na finada operação Lava Jato.

Agora, Lula engendrou a coisa que acha certa.

Lula colocou a espevitada Gleisi Hoffmann (PT-PR), ex-presidente do partido, na Secretaria das Relações Institucionais, para articular com o Congresso Nacional e, para ficar tudo em casa, manteve o namorado de Gleisi e também deputado Linbdberg Farias (PT-RJ) na liderança do PT na Câmara dos Deputados.

Como se vê, dois radicais incompatíveis com a civilidade política, que apóiam abertamente ditaduras e, não obstante, se dizem democratas.

Experiente, Lula da Silva vê a coisa mais longe, muito distante. A caminho dos 80 anos, muito inteligente, visivelmente fragilizado pela idade e alguns problemas de saúde, já está preparando a estrutura de seu conturbado espólio político na eventualidade de não poder levar adiante.  

Lula quer Edinho Silva, ex-ministro petista e ex-prefeito do município paulista de Araraquara, na presidência nacional do partido.

Vai entronizá-lo, certamente. Ninguém no PT contraria Lula. E neste particular, Lula está certo. Edinho Silva destoa desse radicalismo partidário que Gleisi Hoffmann e outras figuras do PT abraçaram.

Em época de queda de popularidade de Lula e do governo, não parece razoável que Gleisi Hoffmann e Lindberg Farias sejam as pessoas ideais para cuidarem da articulação e das costuras entre o Palácio do Planalto e o Congresso Nacional.

Obscurantismo empaca o governo e ninguém quer isto para o Brasil.

Para piorar, Lula da Silva mantém, salvo engano, o excêntrico Randolfe Rodrigues (PT-AP) como líder do governo no Congresso Nacional. O senador do Amapá é o avesso da razoabilidade política.

Todavia, nem tudo está perdido. O senador Jaques Wagner – se não mudar – deverá continuar líder do governo no Senado Federal. Experiente e equilibrado, é o único senador da Bahia que tem condições de exercer, com êxito, essa função.

A verbosa Bahia de Ruy Barbosa se transformou na capitania hereditária do Partido dos Trabalhadores (PT) e está dando as cartas no governo federal através do ex-governador e ministro da Casa Civil, Rui Costa e do senador Jaques Wagner.

A Bahia, ademais, vai mal de senadores. De adesista de primeira hora do carlismo, homem de confiança de Antonio Carlos Magalhães, Otto Alencar (PSD) passou a ser espalhafatoso lulista desde criancinha.

Ângelo Coronel (PSD) não vem demonstrando sabedoria política à altura do cargo, a julgar pelo noticiário.

Sobra Jaques Wagner que, bem ou mal, tem cara de senador, pinta de senador e é senador. Mais do que isto: é atuante.

Entretanto, o que vale é a soberania popular e, neste sentido, a voz das urnas escolheu esses senhores para representarem o estado da Bahia, nos termos da Constituição da República.  

Vamos aturá-los.

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O repórter e a reportagem

O jornalista Sebastião Nery, baiano de Jaguaquara, trabalhava no jornal A Tarde, de Salvador.

O jornal o mandou entrevistar Parsifal Barroso, governador do Ceará, antes ministro do Trabalho de Juscelino Kubitscheck.  

No Ceará, todos diziam, a começar pelo taxista que levou Sebastião Nery do aeroporto ao palácio do governo, que quem mandava de fato por lá era a mulher de Parsifal e não ele.

Informado de que o jornalista faria uma entrevista com o governador, o taxista foi logo dizendo: “se o senhor me permite um palpite, acho que deve falar também com a esposa dele. Quem manda no Ceará é D. Olga”.  

Sebastião Nery foi lá, ouviu Deus e todo mundo e confirmou: quem mandava no Ceará era D. Olga, mulher do governador.

De volta a Salvador, A Tarde deu a manchete: Quem manda no Ceará é a mulher de Parsifal. E seguiu-se a longa reportagem.

Os cearenses apoiadores e amigos do governador ficaram furiosos. A oposição mandou reproduzir a reportagem no jornal O Povo, vinculado à União Democrática Nacional (UDN), antagonista de Parsifal Barroso.

No dia seguinte à publicação da reportagem, Sebastião Nery recebeu um telegrama de Themístocles de Castro, assessor de imprensa do governo do Ceará:

– Jornalista Sebastião Nery: Venha morrer no Ceará.

Sebastião Nery foi ao telégrafo, respondeu.

– Assessor Themístocles de Castro: Não vou.

Um dia procurei Waldir Pires, ministro da Previdência Social do presidente José Sarney, que estava na TV Cultura de São Paulo, onde concederia uma entrevista.

Depois governador da Bahia, Waldir Pires saiu para compor a chapa na condição de vice de Ulysses Guimarães à presidência da República e passou o governo para Nilo Coelho, de Guanambi, mas esta é outra história.

Waldir Pires não respondeu minhas perguntas, que eram duas, alegando falta de tempo, assoberbado com compromissos, mas passou para sua assessoria, que nunca respondeu.

Assessores incompetentes e formigas existem em todo lugar.

Eu havia conhecido Waldir Pires na antiga Sorveteria Primavera, em Juazeiro, recém-chegado do exílio em Paris. Fui apresentado por Francisco Arnóbio de Menezes, de Chorrochó, amigo de Waldir.

Muito sociável, bate-papo convidativo e interessante, Arnóbio fez um salamaleque, elogiou Waldir e coisa e tal e ficamos por alí bebendo e conversando.

A simplicidade de Waldir era impressionante. Memória prodigiosa, democrata convicto, sorriso meigo e sincero, muito atencioso, puxava conversa, queria saber das coisas, engrandecia o ambiente.

Darcy Ribeiro dizia que Waldir Pires tinha cara e pinta de estadista. Ambos eram amigos.

Confesso minha frustração porque não consegui obter as respostas de Waldir. Inexperiente, eu ainda não sabia lidar com os meandros do poder, suas dificuldades e contornos.  Se experiente fosse, teria dado um jeito de colher as respostas.

Eu não tinha – e não tenho – a experiência do gigante Sebastião Nery, que fazia de qualquer momento uma monumental reportagem.

Em tempo:

A entrevista com Parsifal Barroso é contada por Sebastião Nery, in A Nuvemo que ficou do que passou, Geração Editorial, São Paulo, 2009.

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Curaçá perde José Omara Lopes da Silva

À esquerda, José Omara Lopes da Silva e o filho Júlio César, em foto de 2014/Reprodução do ferfil no facebook

Não me lembro a data, assim, de improviso.

Passei a ficar atento e acompanhar o pensamento do curaçaense José Omara quando, ao discordar de um dos meus textos sobre o cenário político nacional, ele o fez com educação, decência, sobriedade, afabilidade e lhaneza.

Presumo que ele não quis melindrar este insignificante autor do texto e, se este foi seu intento, conseguiu: além de não melindrar, incluí-me entre seus admiradores.   

Não o conheci, pessoalmente. Atesto, acanhado, esta lacuna em meu viver na condição de filho de Curaçá, embora as redes sociais me tenham permitido fazer alguns sucintos e ligeiros contatos com ele. Insuficientes, entretanto, para aquilatar sua grandeza de extraordinária figura humana.

O que sei de José Omara – e sei pouco – é que vivia rodeado de amigos e todos queriam estar com ele.

Alegre, espirituoso, querido e, sobretudo, decente, além de eficiente profissional em sua área de atuação.

José Omara mantinha uma espécie de confraria que cultivava amizades e afastava as intempéries do dia a dia.

Somente a grandeza e seriedade das amizades são capazes de tornar a sociedade possível, diante de tantas atrocidades, egoísmos, degenerescências e incompreensões.

Omara tinha como sustentáculos os valores da família Lopes, conhecida por representar dignidade e respeito no município de Curaçá.

Atrevo-me e me arisco a dizer que ainda tenho alguns amigos na conspícua e digna família Lopes, em Curaçá.

São amigos que perduraram, inobstante a passagem inevitável do tempo e essas longas cinco décadas que me mudei de lá.  

Destacou-se na condição de militante da esquerda política sustentada no bom senso e no equilíbrio. Também professor, exercia função de relevo na Prefeitura de Curaçá.

Em abril próximo, salvo engano, Omara completaria 57 anos.

A fatalidade o afastou de parentes, amigos e de todos que o admirávamos e continuamos admirando, in memoriam.

Deixo pêsames à família.

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Hipocrisia e rabo de palha.

“Nada há encoberto que não venha a ser revelado; e oculto que não venha a ser conhecido” (Lucas, capítulo 12, versículo 2)

Deputado federal André Janones (MG). Crédito: Gilmar Félix/Câmara dos Deputados

Este é o mesmo deputado que frequentava exaustivamente às redes sociais para falar de honestidade. E o mesmo que, em primeira hora, apoiou e participou da campanha presidencial de Lula da Silva condenando as rachadinhas (que ele praticava).

Arrogante e autoritário, parecia defensor da verdade mas, pelo jeito, Sua Excelência tem mesmo é avantajada cara de pau.

“O deputado federal André Janones (Avante-MG) fechou um acordo com a Procuradoria-Geral da República (PGR) e se comprometeu a devolver R$ 131,5 mil para encerrar a investigação sobre as suspeitas rachadinha em seu gabinete.

O Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) prevê que o valor será destinado à Câmara dos Deputados. Janones também vai pagar uma multa de R$ 26,3 mil, correspondente a 20% do prejuízo que causou ao erário” (Band Jornalismo, 06/03/2025).

Este caso foi parar no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados, mas o relator Guilherme Boulos – tinha que ser ele – votou pelo arquivamento do processo e livrou André Janones da cassação do mandato.

Com o rabo de palha desse tamanho, certamente o deputado Janones evitava passar perto do fogo.

Mas a falcatrua foi descoberta, a Polícia Federal investigou, levou o caso à Procuradoria Geral da República e ele acabou se queimando.

Ao deputado mineiro, sobram-lhe hipocrisia e rabo de palha.

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