
O luar tem muitas nuances. Até permite o surgimento de clássicos como a música Luar do Sertão, do maranhense Catulo da Paixão Cearense (1863-1946), que um colega meu dos tempos da faculdade insistia em dizer que era cearense.
Nunca consegui convencê-lo de que Catulo era natural do Maranhão. Composta em 1914, já se vão, por aí, 104 anos e ainda hoje continua sendo cantada por jovens e velhos.
A turma do politicamente correto certamente vai me repreender e dizer que a música não é cantada por velhos, mas por idosos. Deixa pra lá.
Catulo sustentava ser o autor de Luar do Sertão, mas a história registra uma controvérsia: o autor seria João Pernambuco (1883-1947), contemporâneo de Catulo.
Aliás, em minha baiana cidade – Curaçá – havia um bar no chamado centro histórico, onde se lia no frontispício, talhadas com esmero, as palavras Luar do Sertão.
Não sei se ainda estão lá o bar e as letras. Se não continuam lá, é porque extirparam um pouco da história da cidade, coisa comum nos dias de hoje, em qualquer lugar.
O luar sempre foi inspirador das serestas, do amor desejado e da vida noturna no interior. Até as casas de chá nele se inspiravam para romantizar seus ambientes.
Lembro um baile intitulado “uma casa de chá ao luar de outubro”, para o qual fui convidado na década de 1970, mês de dezembro, numa cidade do interior da Bahia.
Como sempre me interessei em saber a origem das coisas, achei aquilo muito interessante: o luar era de outubro, mas o baile foi em dezembro. Continuo não sabendo até hoje.
O cantor e compositor José Amâncio Filho (Meu Mano), que nasceu nos domínios de Curaçá, mas se notabilizou em Abaré, inspirou-se no luar para compor algumas de suas canções. Uma curiosidade: o pai de Catulo chamava-se Amâncio José.
Nascido na Fazenda Malhada de Pedra, em 1894, quando Abaré ainda pertencia ao município de Capim Grosso, hoje Curaçá, Meu Mano cresceu vendo o luar do sertão.
Quando eu morava em Patamuté, um amigo de Meu Mano contou um “causo” curioso. Ambos estavam numa bodega, à boca da noite, já à luz do candeeiro, em tempo de lua cheia e o amigo lhe convidou para beber alguma coisa. Meu Mano ponderou: “certo, mas vamos esperar a lua sair”.
O escritor pernambucano Geraldo Granja Falcão escreveu sobre Meu Mano, dentre outras coisas, que “tinha uma vida boêmia, nômade, comunicativa, movimentadora de tantos pedaços de sertões e de gente, fiel às melhores tradições culturais da região”.
E ainda fez história que enriqueceu Curaçá, Abaré e região.
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