Lula da Silva, o 1º de Maio e o PT

“O problema é estrutural no País. Os partidos políticos não representam as opiniões públicas, mas os interesses econômicos. Você elege o candidato para que ele defenda os interesses dele.” (Lincoln Grillo, político de esquerda, que foi prefeito de Santo André – SP, 1926-1982, Repórter Diário, setembro de 2012) 

Quando o Partido dos Trabalhadores (PT) ainda estava nos cueiros e engatinhava com dificuldade – década de 1980 – uma animada turma costumava se reunir no convento dos frades dominicanos, no bairro de Perdizes, em São Paulo.

Bandeira do PT/Site do Partido

Essa turma compunha-se de frequentadores, à época não tanto famosos: Lula, que ainda era somente Luiz Inácio da Silva; Djalma Bom, que foi deputado e vice-prefeito de São Bernardo do Campo; Jacó Bittar, amigo de Lula desde sempre, pai do dono formal do famoso sítio de Atibaia; Devanir Ribeiro, que tinha sido diretor do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e Diadema na gestão de Lula; o combativo advogado de presos políticos Luiz Eduardo Greenhalgh; Paulo de Tarso Vannuchi, mais tarde ministro de Lula e o frade dominicano Carlos Alberto Libânio Christo, frei Betto.

Frei Betto, amigo e confidente de Lula da Silva, coordenava o grupo e cuidava da comida, experiência adquirida na Ordem dos Dominicanos e na cozinha mineira onde estão suas raízes.

Propósito das reuniões: fazer autocríticas, ouvir críticas dos companheiros e confessar erros e equívocos dos presentes. Uma espécie de confessionário especial e coletivo, embora restrito à turma.

O grupo recebeu o nome de “Grupo do Mé”, porque era regado a conhaque e outras bebidas estimulantes do ego, que permitiam a descontração e a expiação dos defeitos de cada um dos participantes, a submissão às críticas, a penitência, a reflexão.

Lula da Silva aprendeu muito nesse grupo. Mais pela autocrítica – que hoje não gosta de fazer – e menos em razão do “mé”, que ele já conhecia de cátedra. As circunstâncias difíceis da ditadura militar exigiam as amizades como bálsamo para o enfrentamento das dificuldades.

Os tempos mais difíceis são aqueles de atrocidades e incompreensões. E aquele era um tempo difícil.

Lula reinava absoluto na esquerda. Hoje está encurralado entre a direita e parte da própria esquerda, cuja especialidade é exagerar em tudo, inclusive na ânsia desenfreada de ocupar todas os espaços do poder .

Aliás, esquerda e direita no Brasil perderam o juízo e a sensatez.

Lula da Silva continua líder, independentemente dos erros que eventualmente tenha cometido ao longo do caminho político que vem trilhando. E quanto a erros parece não haver dúvida que os cometeu.

Mas as misérias e fraquezas de Lula da Silva não devem ser obstáculos ao império da civilidade política.

Em São Paulo, o dia 1º de Maio era sinônimo de unanimidade em torno do então sindicalista Lula da Silva. Hoje, não mais.

O PT não é mais coeso. Ninguém nega isto, nem mesmo próceres do partido e não é uma questão somente de divergência interna no campo democrático. É disputa por cargo, poder e mordomias.

Nesta quadra do tempo – e não só no PT – escasseiam líderes esquerdistas de envergadura moral a exemplo de Waldir Pires, Miguel Arraes, Darcy Ribeiro, Paulo Brossard, Ulysses Guimarães e tantos outros. E sobram figuras menores e folclóricas, incapazes de robustecerem os sonhos da esquerda, mas altamente capazes de radicalizarem o ambiente político nacional.

O destrambelhamento ideológico da presidente nacional PT destoa de grande parte dos filiados. O cansaço de Lula da Silva com essas festividades protocolares, 1º de Maio inclusive, o afastam das bases sindicais e populares, razoavelmente esfaceladas.

Em São Bernardo do Campo, berço político de Lula da Silva e do PT, o que mais se ouve é um amontoado de críticas ao antigo sindicalista Lula. Dos botequins aos ambientes mais sofisticados da elite sambernadense, Lula é uma espécie de “Vai Passar”.

O fato é que Lula da Silva flexibilizou seu discurso de conteúdo voltado ao 1º de Maio e se desviou em direção ao palanque político com vistas às eleições municipais deste 2024.

Escorregou, tropeçou na lei eleitoral e pediu voto extemporaneamente.

araujo-costa@uol.com.br    

Deixe um comentário